terça-feira, agosto 13, 2019

40 anos

"Parece que foi ontem; parece que chovia". 

Acordar com quarenta anos e ter uma leve sensação de que nada mudou. Os dias com a sua poeira macia de acontecimentos, continuam a trazer a rotina. Olho-me no espelho e noto uma escrita vívida, às vezes, torta em cada extensão do pergaminho da minha face.  As coisas parecem estar todas conservadas em seus lugares. Nada é novo - apesar da aparente feição de novidade. 

Há quarenta anos, conta a minha mãe e a história, que eu nasci. Aportei no mundo. Nasci em um casebre. Uma joça feita de barro. Mal dimensionada. Improvisada como são as coisas feitas pela escassez e pela necessidade. Não havia enxovais. Minha mãe era uma jovem de 19 anos. Inexperiente. Humilde. Amedrontada pela novidade que a colocava numa posição vulnerável. Havia falta de empatia por parte de alguns familiares. Incompreensão. Fui agasalhado nas modestas fronhas de que dispunha. Nasci às 11h15min. de uma quinta-feira.

Quarenta anos se passaram a passos largos. Caminho para adiante, mas, vez ou outra, volto o meu olhar para trás. Percebo paisagens variadas. Elas chegam como "flashes"; ou como a explosão leve de fogos de artifício numa noite escura. Vejo a silhueta de eventos. Alguns, consigo identificar. Pareço olhar pela janela, atento a uma liturgia solene e imprevisível. O que virá pela frente?

Cheguei a um ponto delicado, repleto de significados. O tempo corre.  Tento segurá-lo. Ele está sempre um passo à minha frente. Resigno-me. Aprendo que o tempo esculpe o próximo minuto em silêncio; sem alardes; sem tagarelice. Quando dou por mim, a vida está pronta para atestar a sua obra. Aceitamos a marcha incontinenti das horas. Já não há tempo para perder tempo. Os próximo lances devem ser estudados. Quarenta anos se passaram tão rapidamente que parece que não deu tempo de trocar de roupa. 

Ainda tenho coisas para realizar. Como dizia Raul Seixas: "Eu que não me sento, no meu apartamento, com a boca escancarada, cheia de dentes, esperando a morte chegar". Na corda tênue de cada manhã, equilibro-me para não cair. Dou gargalhadas dos meus desatinos. Impaciento-me com a ignorância alheia. Às vezes, sou sério. Há certas variações que são inevitáveis. Acontecem como leis capitais. Mas esta é a minha maneira de ser.