sexta-feira, outubro 26, 2007

Ao correr da pena

As folhas brancas – depositárias das idéias.
Como entes abandonados a desejar
O correr luxurioso da pena.
A fricção que é apenas
Contato mecânico e epidérmico.
No fundo existe a idéia que surge
E se espalha pelos hortos da minha alma,
Como sombras feitas por nuvens gordas.
Correm silentes que nem percebo o movimento.
Vem do alto para baixo.
São revelações silenciosas.
Sou um deus sem poderes inumanos.
Apenas a palavra que brota,
Nasce como capim.
Esparrama-se ladeira abaixo,
Precipitando-se pelos desfiladeiros da saudade.
A janela aberta é um convite
Para essas mil solidões sem faces.
Gestada por ato unilateral.
O parto se dá no encontro
Do lápis com o papel.
São as idéias gratuitas, meninas.
A plangência das horas,
O réquiem que somente eu escuto.
O não sentido que se aplica onde
Os outros dizem enxergar a vida.
Consonância, harmonia, intervalo no tempo.
O emaranhado de sensações que aprisiona
Como os tentáculos de um monstro mitológico.
O desejo de ficar nu, correr o mundo.
O mundo possui absurdos irreais
E fantasias reais.
Fico com o papel,
O lápis e as fantasias irreais.

Por Carlos Antônio Maximino de Albuquerque

quarta-feira, outubro 24, 2007

Cotidiano

Os meus pés estão dentro
do carrossel veloz do
cotidiano.
O seu giro que me
entorpece.
As suas mutações insensíveis
deixa-me em estado agônico.
A cabeça já não é a mesma.
Algumas certezas não
resistiram.
O riso de ontem soçobrou
no último por to distante.
As pernas cambaleantes
já não suportam a caminhada.
O corpo lânguido não suporta
as arranhaduras da caminhada.
As dores do mundo se penduram
no ombro magoado.
A manhã me trouxe certezas
e incertezas dúbias.
Aqui estou para mais esse ato.

sexta-feira, outubro 19, 2007

Comentário sobre A Barca de Portinari

Fui a uma exposição sobre Portinari e me impressionei com o quadro intitulado A Barca (1941). Trata-se de um óleo sobre tela 200 x 200 cm. Uma tela de grandes dimensões. A impressão que fica à primeira vista é a nossa estatura diminuída diante do enorme, do silencioso, que nos absorve. A pintura em sua mensagem silenciosa é um apelo. Ouvimos o marulho das águas tempestuosas. A tela possui um aspecto soturno, aziago. As cores são fortes. Não dá para precisar se o espaço que o quadro está inserido é noturno ou se há a retratação de um vendaval que apanhou o barco e sua tripulação.
Um fundo negro com manchas entre o violeta e o azul contrasta com as águas escuras. Ondas vaporosas se erguem. O barco parece singrar por sobre as águas. O vento é rebelde e simboliza a força da natureza. Dá para perceber que a força do vento arroja e comprime os personagens. O vento faz voar os cabelos de um dos personagens que se abaixa para acordar alguém que está dormindo. Este espaço aberto nos impulsiona a crer que antes do momento difícil, havia calma e tranqüilidade. Para que alguém dormisse era necessário que houvesse calmaria. Talvez ainda Portinari tivesse na mente uma das histórias do Evangelho, que nos afirma que certa vez enquanto os discípulos de Jesus atravessavam o mar da Galiléia foram surpreendidos por um vento rijo, tempestuoso. Todos se dirigiram para Jesus, enquanto este dormia tranqüilamente na proa do barco. Os discípulos desejavam acordá-lo com instância. Não se sabe ao certo o que se passava na cabeça do poeta/artista, mas esse espaço aberto no quadro nos possibilita costurar essa ilação. Ou talvez ainda o pintor quisesse inserir um elemento religioso.
O barco inclina para o lado de quem olha a tela e sugere que os personagens correm perigo. Todos olham aflitos. Erguem os braços como que a pedir ajuda. Os braços erguidos solicitam solidariedade. Os olhos fitos, fixos, maquinais, aflitos, induzem o observador do quadro a sentir a dor dos personagens. Uma das personagens tem as mãos na boca. O choro parece ser anunciado. o vestido com bolinhas vermelhas demonstra o aspecto infantil. São crianças. Portinari tinha uma obsessão por pintar crianças. Várias obras ele dedicou a descrever as cenas infantis. Na exposição havia outros quadros. Por exemplo, O menino com o pião (1947); ou ainda O menino com carneiro. As personagens infantis rivalizam com o momento de seriedade que envolve a cena. Tem-se constituído a priori um paradoxo - a serenidade infantil, demonstrando inocência e o poder trágico da tempestade.
As personagens possuem um dos lados do corpo envolvidos pela negritude. Um dos personagens se abaixa todo para pegar um peixe. Arroja o peixe com as duas mãos. O animal parece querer lhe escapulir. Em torno do local aonde está o ser das águas, existe um espaço que nos sugere que está havendo uma luta, um esforço da parte do peixe para voltar ao seu espaço/mundo. A personagem se prostra completamente e parece ignorar o desespero das demais crianças que estão no barco. Os seus cabelos se derramam pela lateral do barco. Parece-me que o autor desejasse mostrar os aspectos mais profundos da infância: que mesmo diante do perigo, das situações difíceis sabem dosar muito bem essas características mais complexas e abafá-las por completo com o jogo mais comedido – a brincadeira.

quarta-feira, outubro 17, 2007

A luz da arte e a minha cegueira

A primeira impressão que tive da pintura ao lado foi de estranhamento. Afinal de contas, não enxerguei em minhas limitações as paisagens que Benjamim descreve. Os olhos de minha sensibilidade precisam de um colírio forte para limpar a minha alma. Perguntei a um colega o que ele via na pintura e ele me respondeu mais ou menos assim: "Acredito que seja um desenho de criança". Nunca cheguei a conhecer as intenções de Klee. Mas entendo acima de qualquer coisa que a resposta do meu colega tenha um propriedade e uma profundidade inerentes. A pintura revela as mãos infantis do artista. A arte é séria, mas brinca com as nossas convenções. Ela nos choca porque fala daquilo que não estamos acostumados. Vivemos o trivial. Vemos o mundo por meio de sombras e quando nos apresentam a luz daquilo que pode ser, assustamo-nos. É bem parecido com aquilo que Platão narra em seu Mito da Caverna. Sei que as palavras revelam os limites do meu mundo, anunciando de onde venho, quem sou, as minhas experiências e as minhas limitações. Com certeza, quem mais entedeu esse quadro fora de Klee foi Walter Benjamin. O filósofo afirma de forma brilhante o seguinte sobre o quadro de Paul Klee:



"Há um quadro de Klee chamado Angelus Novus. Representa um anjo que parece a ponto de afastar-se para longe daquilo a que está olhando fixamente. Seus olhos estão arregalados, sua boca aberta, suas asas estendidas. O anjo da história deve ter este aspecto. Seu rosto está voltado para o passado. Onde diante de nós aparece um encadeamento de acontecimentos, ele vê uma catástrofe única, que vai empilhando incessantemente escombros sobre escombros, lançando-os diante de seus pés. O anjo bem que gostaria de se deter, despertar os mortos e recompor o que foi feito em pedaços. Mas uma tempestade sopra do Paraíso e se prende em suas asas com tal força, que o anjo já não as pode fechar. A tempestade irresistivelmente o impele ao futuro, para o qual ele dá as costas, enquanto o monte de escombros cresce até o céu diante dele. O que chamamos de Progresso é esta tempestade".

quinta-feira, outubro 11, 2007

Impressões

Estática como uma rocha.
Impenetrável como uma fortaleza.
Segredos invioláveis.
Gestos sombrios.
Manhã soturna, num céu noturno.
Encontros.
Por outro lado: desencontros.
Oscilações.
Gravitações.
As estações feitas em rondó.
Segredos velados, aveludados, recorrentes.
Pasmos, paciência chorosa.
Visitado pela esperança, assaltado pelo desespero.
O que se constrói, destrói.
O que é experimentar o novo?
Atenção terreno pantanoso à frente.
Susto.
Tresvario.
Deixo a vida como quem deixa o tédio.
A chuva cairá esta manhã.
Vou me alagar.
Barricadas, urgente!
Fraqueza, lassidão.
Desfecho infeliz.
Mais um rondó.
Ciranda animada.
Roda-Viva, círculo de fogo, queimador de entranhas.
Chamuscamento.
Vai manhã e vem manhã e terra permanece para sempre.
Lei perpétua, caos perpétuo.

Por Carlos Antônio M. Albuquerque

terça-feira, outubro 09, 2007

Você tem um furúnculo?

Este é um texto de um grande mineiro: Rubem Alves. Gosto especialmente deste texto porque revela a profunda relação que o poeta possui com o sofrimento, com o parto, com a agonia de criar, de trazer à vida aquilo que grita dentro da alma. A arte é um acerto de contas consigo mesmo. É um ferrumamento insistente que se insurge e deseja ver a luz do mundo a fim de habitar os corações.


Há um ditado Zen que diz: "Nunca mostres o teu poema a um não poeta." Você me enviou os seus poemas. Isso quer dizer que você me considera um poeta. Mas eu mesmo não sei se sou poeta. Sei que escrevo poeticamente, porque brinco com imagens, sons e ritmos. Mas um poema nunca me pediu que o escrevesse. Régis de Moraes, amigo meu poeta, disse-me que quando há dentro dele um poema para ser escrito ele se sente como um galinha que tem um ovo para ser botado. Eu nunca senti isso...
Você me enviou os seus poemas desejando que eu os leia. Nada mais justo: quem escreve deseja ser lido. Mas mais do que isso: você deseja que eu goste dos seus poemas. E que eu diga: "Você é um poeta! Merece ser publicado!" Está certo: quem escreve deseja que seus textos sejam transformados em livro.
Houve uma só vez, em toda a minha vida, em que lutei para que um livro de poemas fosse publicado. A Maria Antônia era minha aluna na UNICAMP. Tinha - e ainda tem - uma carinha de menina travessa. Acho que vai morrer com ela, a carinha travessa... Me deu um livrinho artesanal, Fogo-Pagô, com essa dedicatória: "Rubem: eu acho você engraçado e gosto de você e fico desejando que você leia esse livro e ache alguma graça nele. 1 abraço. Maria Antônia.
15.04.82." Amanhã completa 20 anos. Ela não foi a primeira mulher a me achar engraçado. Quando fui professor visitante no Union Theological Seminary (New York, 1971) meus alunos começaram a vir ao meu escritório, na véspera da minha volta ao Brasil, para se despedirem. Chegou uma jovem, longos cabelos ruivos, sardenta. Olhou-me nos olhos e disse: "Sonhei com você..." Sorri, imaginando o que ela teria sonhado. "Sonhei que você era um palhaço..." Aí meu sorriso virou riso: ela havia entendido. Sou palhaço. E estou em boa companhia: no final de um dos seus poema Nietzsche disse que ele era apenas um palhaço, apenas um poeta... O fato é que o rosto de menina travessa e o fato de ela me haver achado engraçado me seduziram. "Fogo-pagô canta manso e triste/ fazendo eco no fundo da gente/ encavalando alegria e agonia,/ que daí ficam disputando entre si/ prá reinarem no peito..." Foi amor à primeira vista porque o poema dela chamou pelo nome certo o canto que eu ouvia sempre nomeu peito... Depois ela escreveu outros. Um deles eu batizei e prefaciei, Ceriguela. Até que, indignado com a dificuldade que têm os poetas para publicar seus poemas, batalhei com o pessoal da Papirus e eles também sentiram o que eu sentia e publicaram o Terra de formigueiro.
Mas não me julgo em condições de avaliar poemas. Eu não sou poeta. Assim, faltam-me as credenciais. E o pior: falta-me tempo. A Natália, minha assessora, comentou dias atrás que, se eu fosse ler todos os textos que me são enviados para serem apreciados eu teria que abandonar tudo o que faço, deixar de escrever minhas coisas, e ler sem parar, 24 horas por dia, e ainda assim eu não daria conta... Razão por que eu nem mais aceito convites para participar de bancas de tese. O tempo não dá! O tempo não dá! O Drummond se viu em situação idêntica e até escreveu um texto bravo com o título Apeloaos meus dessemelhantes em favor da paz. Não, não era a paz mundial. Era a paz dele... Ele também não dava conta. Ele só queria ter tempo para escrever as coisas dele e ler os livros que quisesse...
Lamento mas minha prioridade de vida é botar os meus ovos, escrever as coisas que me dóem. Igual a um furúnculo... Você já teve furúnculo? Incha, fica vermelho, lateja, dói, forma aquele ponto amarelo de pus. Tem de ser espremido. Dói para ser espremido. Mas é só através da dor do espremer que ele pára de doer. Escrever é assim. Um texto a ser escrito é um furúnculo que dói. Os seus poemas dóem em você? Ficam atormentando você, pedindo para ser escritos? Ou são simples coceiras? Só se meta a ser poeta se seus poemas doerem muito... Escrever poesia é um ofício terrível. Primeiro porque há poetas gigantescos como Fernando Pessoa, Hilda Hilst, Cecília Meireles. Segundo, porque é muito difícil que as editoras publiquem livros de poemas.Poesia, com raríssimas exceções, é mau negócio. Dá prejuízo.
Seus poemas nascem de inspiração? Leia atentamente essa precisa descrição da experiência da inspiração, feita por Nietzsche e, honestamente, diga se esse é o seu caso. "Será que alguém, ao final do século dezenove, tem uma idéia clara daquilo a que os poetas das eras fortes chamaram pelo nome de inspiração? Se não, vou descrevê-la. Repentinamente, com certeza e sutileza indescritíveis, algo se torna visível, audível, algo que nos sacode em nossas últimas profundezas e nos lança por terra... A gente não busca; ouve. Não pede ou dá; aceita. Como um relâmpago, um pensamento se ilumina de forma irresistível, sem hesitações com respeito à sua forma. Eu nunca tivequalquer escolha! Tudo acontece de forma involuntária no mais alto grau, mas como uma onda enorme de liberdade, um sentimento de algo absoluto, de poder, de divindade." É assim que acontece com você?
Se é assim que acontece com você, então, vale a pena prosseguir. Não pelos livros que você venha a publicar, mas pela simples alegria de... botar o seu ovo... Mas é preciso honestidade para distinguir entre furúnculos e coceiras...
O que melhor posso fazer é dar a você, e a todos os que amam poesia, algumas sugestões.
Leia, em primeiro lugar, o maravilhoso livro de Rainer Maria Rilke Cartas a um jovem poeta. São cartas de enorme delicadeza, sensibilidade e honestidade. Rilke as escreveu a um jovem que lhe enviara poemas de sua autoria, pedindo que o poeta desse a sua opinião. Que tempo maravilhoso aquele, quando o tempo andava devagar, e havia tempo para se escrever longas cartas em papel, com tinta, caneta, mataborrão, envelope, selo e caminhadas até o correio... Tempo feliz aquele, quando a chegada do carteiro era um evento grave, pois se sabia que cartas eram, sempre, portadoras doessencial.
Leia, depois, o Manoel de Barros, poeta matogrossense... Livro sobre nada, Livro de pré-coisas, Arranjos para assobio, O livro das ignorãnças... O Manoel da Barros é mestre de aforismos, afirmações curtas, marteladas na cabeça de um prego, que desarrumam o arrumado e fazem pensar. "Palavra poética tem que chegar ao grau de brinquedo para ser séria". "A terapia literária consiste em desarrumar a linguagem a ponto que ela expresse nossos mais fundos desejos." "Melhor que nomear é aludir. Verso não precisa dar noção." "Tem mais presença em mim o que me falta." "Quem acumula muita informação perde o condão de adivinhar." "Eu queria avançar para o começo. Chegar ao acriançamento das palavras." "Deus deu forma. Os artistasdesformam. É preciso desformar o mundo: Tirar da natureza as naturalidades.Fazer cavalo verde, por exemplo. Fazer noiva camponesa voar - como emChagall..."
E ler, bovinamente, ruminantemente, em voz alta, os poetas... É preciso ler em voz alta. Poesia não é pensamento. É música. Você sabe ler? Claro: eu sei que você sabe ler... Mas não é isso que estou perguntando. Estou perguntando se, ao ler, suas palavras fazem música. E os seus poemas? Que música fazem eles? Leia Alberto Caeiro, Álvaro de Campos, Fernando Pessoa, Mário Quintana, Adélia Prado, Cecília Meireles, Hilda Hilst, Chico Buarque, Vinícius...
Para terminar vou transcrever o que Rilke escreveu ao término de sua primeira carta: "Mas talvez se dê o caso de ter o senhor de renunciar a se tornar poeta. Basta sentir que poderia viver sem escrever para não mais se ter o direito de fazê-lo..."
DICA: Vocês sabem como eu amei o DALÍ, restaurante onde pus os meus sonhos. Não deu certo. Fechei o DALÍ. Mas um amigo o reabriu. Está muito bom! Sugestão: experimente almoçar lá. Comida excelente. Bufê à vontade! Música suave. Sobremesa incluída. Os homens pagam R$ 7,90. As mulheres... R$ 6,90. E tudo ao lado da sombra da velha mangueira...
Por Rubem Alves

sexta-feira, outubro 05, 2007

A educação brasileira numa contingência histórica.

Atualmente estou sem tempo para escrever, por isso, recsolvir colocar nesta semana um texto escrito para uma atividade da faculdade
Analisando sob uma perspectiva comparativa o tipo de colonização que o Brasil – colonização de exploração – e o tipo de colonização que países como os Estados Unidos sofreram há uma abismal diferença. O tipo de colonização que este país sofreu tinha por objetivo reproduzir as condições da Metrópole nesse “Novo Mundo”. Portanto, a relação que a Metrópole tinha com a Colônia não era espoliativa. Era, na verdade, um tipo de colonização para novas oportunidades. As famílias que migravam para os Estados Unidos, por exemplo, levavam consigo o sonho de reproduzir na nova terra as condições elementares que haviam deixado.

O tipo de subordinamento que os países periféricos sofreram não teve esse tipo de contingência. Os países que foram alvo de um modelo de colonização de exploração amargam grandes problemas estruturais ainda hoje – subordinação cultural, econômica, política e etc. É inegável que esse princípio de decadência tenha a sua gênese no tipo de colonização a que foram submetidos. O colonialismo português e espanhol infringido à América Latina, expropriou-a de seus minérios, suas florestas e seus vários recursos. E um dos vetores mais eficazes foi a desapropriação dos nativos que haviam no continente dos seus usos e costumes. As nações pré-colombianas, como são chamados os povos que estavam no continente antes da chegada de Colombo foram dizimados e tiveram os seus respectivos patrimônios destruídos. Restaram apenas lembranças. Um exemplo claro são o dos indígenas brasileiros: quando da chegada dos portugueses ao Brasil haviam 5 milhões de indígenas, sendo que atualmente há em todo o território nacional pouco menos de 300 mil. Esse é um claro exemplo da exploração imposta à nova terra.

O caso brasileiro é especifico em seu processo, mas não diverge em muitos episódios de exploração engendrados na América Latina. Os portugueses ao chegarem às terras brasileiras, foram claros na explicitação de seus interesses. Pero Vaz de Caminha, o escrivão da esquadra de Cabral, fala ao rei de português que naquele momento ainda não era claro se haviam metais ou outros apetrechos de interesse para a Metrópole. Decorridos trinta anos, os portugueses voltam ao país dispostos a retirar dele tudo aquilo que fosse possível e necessário. Começa a partir daí uma espécie de “esmagamento” da terra, posto que os portugueses queriam apenas “retirar”, “extrair” bens para alimentar a corte e a burguesia portuguesa. Não há um interesse claro em consolidar uma estrutura que possibilitasse a autonomia da colônia.
A Colônia era um ente subordinado. Um latifúndio da Metrópole. A noção geral dos portugueses era submeter os povos aqui encontrados. A vinda dos jesuítas tem esse objetivo claro. O processo de aculturação vitimou os indígenas que tiveram de aprender uma nova religião, usar outras vestimentas, disciplinar-se nos costumes dos “ditos brancos cristãos civilizados”. A Companhia de Jesus aplicou sobre a mentalidade dos indígenas um tipo de currículo medieval, baseado numa educação domesticadora. Os indígenas aprendiam a tocar a música dos brancos, a rezar como os brancos a repetir a fala dos brancos e eram tratados como bichos.
Ora, é inegável que um tipo relação meramente expropiadora como a que se deu de Portugal em relação à Colônia tenha gerado uma consciência, um comportamento, uma personalidade na sociedade que então nascia. Quando se analisa a conjuntura histórica nacional é perceptível que não houve em nenhum período da história nacional, um investimento num tipo de educação emancipadora; numa base que permita ao aprendente fazer uma análise crítico-criadora da realidade em que ele está inserido.
Muito dos aspectos que norteiam o comportamento do país são resultado de sua história. Daí a necessidade de se entender o fluxo da História. Ela é criada por alguns indivíduos ou uma classe que submete os dominados a um comportamento imobilizante. No caso brasileiro, em muitos aspectos o organismo nacional ainda continua manietado pela posição em que o colocaram – sempre de uma postura de subordinação. Um método tradicional de educação apenas consente com a construção que está aí posta.
Sendo assim, concluímos que a repetição de um currículo que priorize o tradicionalismo não dá ao aluno uma capacidade crítica para pensar, refletir e discernir a realidade. E essa realidade não existe como ente-em-si (estrutura autônoma), mas é o resultado criado pela atuação dos homens sobre as condições que o mundo externo permite criar. Essa relação privilegia os mais fortes e submete os mais fracos. A história nacional mostra explicitamente que o tradicionalismo impingiu uma mentalidade conservadora e imobilista da sociedade, bem como dos atores que construíram a História nacional – uns como protagonistas, outros como coadjuvantes.