sábado, junho 27, 2020

"Três homens em conflito", de Sérgio Leone


 Terminei de assistir, ontem à noite, ao espetacular "Três homens em conflito" (1966), de Sérgio Leone, também conhecido como "O Bom, o Mal e o Feio". É daqueles filmes que, mesmo terminando, ficam você. Uma hora ou outra, "flashes" vêm e vão. Sentimos uma espécie de saudade dos personagens. Um desejo enorme de que tudo se alongue e nunca tenha fim. É a impressão que me vem à cabeça. Certamente, um dos mais sensacionais filmes já feitos na história do cinema. 


Sérgio Leone é genial. Impressiona como ele eleva a categoria "western". Com ele, o gênero deixa de ser uma produção com sujeitos sujos que atiram um nos outros; e com cara de poucos amigos. Nota-se, ainda, o quanto existe de Sérgio Leone nos filmes de Quentin Tarantino. Um exemplo, é "Bastardos Inglórios" (2010) ou "Django Livre" (2013). Tarantino persegue a mestria de Leone. Não existe nada de original no autor de "Era uma vez em... Hollywood". 

Outra questão apontada é a maravilhosa trilha sonora, escrita por Ennio Morricone, que funciona como um personagem na obra. A última cena do filme é emblemática. A grande paisagem desértica surge. A personagem vai se amiudando nela, mas a música cresce. É ela que fica. Até agora estou com a trilha sonora na cabeça (já tive a oportunidade de escutá-la no Spotify). Há aquele tema inicial famoso: "The Good, The Bad and The Ugly". Há ainda belíssimas canções como "Padre Ramirez", "The Story of a soldier" e "The Desert".

A fotografia do filme é outro milagre do cinema. Leone, certamente, demonstra nesse sentido a sua genialidade. É um filme, plasticamente, belo. As paisagens são maravilhosas. O figurino das personagens bem como a retratação dos cenários demonstram a percepção elevada de Leone em reproduzir a Guerra Civil Americana, já que o filme se passa nesse período.

As três personagens são impecáveis. Clint Eastwood ("O Bom") rouba a cena com a sua fisionomia imortal de poucos amigos. Ele quase não fala. Eli Wallach ("O Feio") também impressiona pela sensacional atuação. Ele é o mais cômico, o mais bonachão. Pareço ainda ouvir a sua voz: "Lourinho..", "Lourinho". Das três personagens, ele é a que mais aparece. E Lee Van Cleef ("O Mal) parece ter nascido para fazer o papel de vilão em filme de "western". 

"Três homens em conflito" é daqueles filmes que se imortalizam em sua memória. Você se sente obrigado a vê-lo mais de uma vez. É o que sinto. 

domingo, junho 21, 2020

Lista com os 200 romances ocidentais necessários, segundo Idelber Avelar

Serviço de utilidade pública para quem deseja mergulhar nos profundos e inefáveis mundos da literatura. O professor Idelber Avelar, grande especialista no assunto, fez uma lista com 200 romances que ele, simplesmente, nominou como "os 200 maiores romances ocidentais". Sabemos que as listas são controversas. São resultado de experiências individuais, por isso, são idiossincráticas. Todavia, como se trata de alguém que conhece o assunto sobre o qual está falando, devemos, minimamente, prestar atenção. 

Trata-se de tarefa difícil. Certamente, muita coisa boa fica de fora. Mas, estão ali Cervantes, Dostoiévski, Machado de Assis, Flaubert, James, Graciliano, James, Musil, Saer, Virginia Woolf, Tolstói, Auster, Clarice Lispector e até mesmo meu querido José Lins do Rego com o espetacular Fogo Morto

Segundo o próprio Idelber, os critério utilizados foram:  "qualidade (realização estética), influência (legado no cânone) e importância (que pode não ser redutível nem à qualidade nem à influência), combinados, claro, com minhas próprias idiossincrasias pessoais". 

E, ainda, eclarece: "Em geral, nessas listas, o romance europeu, especialmente de línguas inglesa e francesa, costuma estar sobrerrepresentado. Esta lista concede o protagonismo que julgo merecido à América Latina. Dez dos romances listados aqui são brasileiros. Doze são argentinos. Sete são mexicanos, e Colômbia, Peru e Uruguai estão representados por dois títulos cada. Há três romances cubanos".

Uma das facetas mais interessantes do trabalho do professor Idelber foi ter procurado os links espalhados pela internet e disponibilizá-los na sequência. Isso é que trabalho de humanização.  

Segue a lista: 


1 — Ulysses, James Joyce.

2 — Don Quijote de la Mancha, Miguel de Cervantes.

3 — Grande sertão: veredas, João Guimarães Rosa.

4 — Os irmãos Karamazov, Fiódor Dostoiévski.

5 — Moby Dick, Herman Melville.

6 —Madame Bovary, Gustave Flaubert.

7 — The ambassadors, Henry James.

8 — Der Prozess, Frank Kafka.

9 — Light in August, William Faulkner.

10 — Paradiso, José Lezama Lima.

11 — Anna Kariênina, León Tolstói.

12 —Der Zauberberg, Thomas Mann.

13 —To the lighthouse, Virginia Woolf.

14 —Museo de la novela de la eterna, Macedonio Fernández.

15 —Die Wahlverwandtschaften, Goethe.

16 — Voyage au bout de la nuit, Louis-Ferdinand Céline.

17 —A tale of a tub, Jonathan Swift.

18 — Der Mann ohne Eigenschaften, Robert Musil.

19 — El entenado, Juan José Saer.


21 — La vida breve, Juan Carlos Onetti.

22 —The golden bowl, Henry James.

23 — Illusions perdues, Honoré de Balzac.

24 — Pedro Páramo, Juan Rulfo.

25 —Memórias póstumas de Brás Cubas, Machado de Assis.


27 — The sound and the fury, William Faulkner.

28 — The wings of the dove, Henry James.

29 — A book of memories, Péter Nádas.

30 — Guerra e paz, León Tolstói.

31 —Emma, Jane Austen.

32 — The U.S.A. trilogy, John dos Passos.

33 — Le rouge et le noir, Stendhal.

34 —Darconville’s cat, Alexander Theroux.

35 — Frankenstein, Mary Shelley.

36 — Les misérables, Victor Hugo.

37 — Recuerdos del porvenir, Elena Garro.


39 —Crime e castigo, Fiódor Dostoiévski.

40 — Die Angst des Tormanns beim Elfmeter, Peter Handke.

41 — Gulliver’s travels, Jonathan Swift.

42 — The New York Trilogy, Paul Auster.

43 —As I lay dying, William Faulkner.

44 — Orlando, Virginia Woolf.

45 — The picture of Dorian Gray, Oscar Wilde.

46 — La traición de Rita Hayworth, Manuel Puig.

47 — Austerlitz, W.G. Sebald

48 — À la recherche du temps perdu, Marcel Proust.

49 — Conversación en la catedral, Mario Vargas Llosa.

50 — The man in the high castle, Philip K. Dick.

51 — Yo, el supremo, Augusto Roa Bastos.

52 — Das Schloss, Franz Kafka.

53 — El luto humano, José Revueltas.


55 — A relíquia, Eça de Queiroz.

56 — Glosa, Juan José Saer.

57 — Tom Jones, Henry Fielding.

58 — The lord of the rings, J.R.R. Tolkien.

59 — Gravity’s Rainbow, Thomas Pynchon.

60 — The narrative of Arthur Gordon Pym, Edgar Allan Poe.

61 — Sabbath’s Theater, Philip Roth.

62 — Adán Buenosayres, Leopoldo Marechal.

63 — The map of love, Ahdaf Soueif.


65 — Pais e filhos, Ivan Turguêniev.

66 — Lady Chatterley’s lover, D. H. Lawrence.

67 —Respiración artificial, Ricardo Piglia.

68 — Die Verwandlung, Franz Kafka.

69 — Il nome della rosa, Umberto Eco.


71 — Moll Flanders, Daniel Defoe.

72 —2666, Roberto Bolaño.

73 — Porque parece mentira la verdad nunca se sabe, Daniel Sada.

74 — Bartleby, Herman Melville.

75 — Perto do coração selvagem, Clarice Lispector.

76 — The female Quixote, Charlotte Lennox.


78 — It, Stephen King.


80 — Cien años de soledad, Gabriel García Márquez.

81 — Mansfield Park, Jane Austen.

82 — Lord of the flies, William Golding.

83 — Vineland, Thomas Pynchon.

84 —A confederacy of dunces, John Kennedy Toole.

85 — Los pasos perdidos, Alejo Carpentier.

86 — Berlin Alexanderplatz, Alfred Döblin.

87 — Gargantua et Pantagruel, François Rabelais.

88 — L'amica geniale, Elena Ferrante.

89 —The talented Mr. Ripley, Patricia Highsmith.

90 — Blood Meridien, Cormac McCarthy.

91 — Les mystères de Paris, Eugène Sue.

92 — Le Père Goriot, Honoré de Balzac.

93 — The man who was Thursday, G. K. Chesterton.

94 — Les trois mousquetaires, Alexandre Dumas.

95 — The awakening, Kate Chopin.

96 — Venus im Pelz, Sacher-Masoch.

97 — El pasado, Alan Pauls.

98 — L’étranger, Albert Camus.

99 — How the dead live, Will Self.

100 — Midnight’s children, Salman Rushdie.

101 — Jude the Obscure, Thomas Hardy.

102 — Murder on the Orient Express, Agatha Christie.

103 — Song of Solomon, Toni Morrison.

104 —Los trabajos de Persiles y Segismunda, Miguel de Cervantes.

105 — Die Blechtrommel, Günter Grass

106 — La modification, Michel Butor.

107 — Fogo morto, José Lins do Rego.

108 — Les Mandarins, Simone de Beauvoir.

109 — The big sleep, Raymond Chandler.

110 — El zorro de arriba y el zorro de abajo, José María Arguedas.

111 — Germinal, Émile Zola.

112 — The war of the worlds, H. G. Wells.

113 —Os cus de Judas, António Lobo Antunes.

114 — Brave new world, Aldous Huxley.

115 — La coscienza di Zeno, Italo Svevo.

116 — Breakfast at Tiffany’s, Truman Capote.

117 — The last September, Elizabeth Bowen.

118 —Farabeuf, o la crónica de un instante, Salvador Elizondo.

119 — Jane Eyre, Charlotte Brontë

120 —Main street, Sinclair Lewis.

121 — Terra Nostra, Carlos Fuentes.

122 — Avalovara, Osman Lins.

123 —Santa Evita, Tomás Eloy Martínez.

124 — The scarlet letter, Nathaniel Hawthorne.

125 — Candide, Voltaire.

126 — The red badge of courage, Stephen Crane.

127 — Bouvard et Pécuchet, Gustave Flaubert.

128 — Go tell it on the mountain, James Baldwin.
 
129 — Wilhelm Meister, Goethe.

130 —Atonement, Ian McEwan.

131 — Les faux-monnayeurs, André Gide.

132 — Catch-22, Joseph Heller.

133 — La vie: mode d’emploi, Georges Perec.

134 — The handmaid’s tale, Margaret Atwood.

135 — Memoires d’Hadrien, Marguerite Yourcenar.

136 — Doña Bárbara, Rómulo Gallegos.

137 — Lolita, Vladimir Nabokov.

138 — The waves, Virginia Woolf.

139 — Slaughterhouse five, Kurt Vonnegut.

140 — Winnesburg, Ohio, Sherwood Anderson.

141 — Heart of darkness, Joseph Conrad.

142 — Infinite jest, David Foster Wallace.

143 — La invención de Morel, Adolfo Bioy Casares.

144 — American pastoral, Philip Roth.

145 — Kindred, Octavia E. Butler.

146 — Dom Casmurro, Machado de Assis.

147 — A clockwork orange, Anthony Burgess.

148 — Juntacadáveres, Juan Carlos Onetti.

149 — Crônica da Casa Assassinada, Lúcio Cardoso.

150 — Os demônios, Fiodor Dostoiévski.

151 — A farewell to arms, Ernest Hemingway.

152 — Oppiano Licario, José Lezama Lima.

153 — Great expectations, Charles Dickens.

154 — Histoire de l’ oeil, Georges Bataille.

155 —Rebecca, Daphne du Mourier.

156 — American Psycho, Bret Easton Ellis.

157 — Their eyes were watching god, Zora Neale Hurston

158 — Ragtime, E. L. Doctorow.

159 — Um defeito de cor, Ana Maria Gonçalves.

160 — The grapes of wrath, John Steinbeck.

161 — Clarissa, Samuel Richardson.

162 — Los siete locos, Roberto Arlt.

163 — The hound of the Bakersville, Arthur Conan Doyle.

164 — The Maltese falcon, Dashiel Hammet.

165 —Oficio de tinieblas, Rosario Castellanos.

166 — Underworld, Don DeLillo.

167 — Le paysan de Paris, Louis Aragon.

168 — Doktor Faustus: Das Leben des deutschen Tonsetzers Adrian Leverkühn, erzählt von einem Freunde, Thomas Mann.

169 — The violent bear it away, Flannery O’Connor.

170 — The great Gatsby, Scott Fitzgerald.

171 — L’éducation sentimentale, Gustave Flaubert

172 — The gods themselves, Isaac Asimov.

173 — Invisible man, Ralph Ellison.

174 — O mestre e a margarita, Mikhail Bulgakov

175 — Les liaisons dangereuses, Choderlos de Laclos.

176 — I promessi sposi, Alessandro Manzoni.

175 — La pelle, Curzio Malaparte.

176 — Doktor Zhivago, Bóris Pasternak.

177 — Eugene Oneguin, Alexander Pushkin.

178 — Pale fire, Vladimir Nabokov.

179 — Cicatrices, Juan José Saer.

180 — Native son, Richard Wright.

181 — The bell jar, Sylvia Plath.

182 — The last of the mohicans, James Fenimore Cooper.

183 —El beso de la mujer araña, Manuel Puig.

182 — To kill a mocking-bird, Harper Lee.

183 — Dracula, Bram Stoker.

184 —Fahrenheit 451, Ray Bradbury.

185 — Wuthering Heights, Emily Brontë.

186 — Under the volcano, Malcolm Lowry.

187 — Hasta no verte, Jesús mío, Elena Poniatowska.

188 — The color purple, Alice Walker.

189 — Murphy, Samuel Beckett.

190 —Changó, el gran putas, Manuel Zapata Olivella.

191 — Justine ou les malheurs de la vertu, Marquês de Sade.


193 — Sister Carrie, Theodore Dreiser.

194 — Brideshead revisited, Evelyn Waugh.

195 — São Bernardo, Graciliano Ramos.

196 — Voyage au centre de la Terre, Jules Verne.

197 — Almas mortas, Nikolai Gógol.

198 — Indiana, George Sand.

199 — Middlemarch, George Eliot.

200 —Dois irmãos, Milton Hatoum.

Idelber Avelar no Facebook.  

Blog do Idelber.

terça-feira, junho 09, 2020

Descolonizar



Da página do Instagram da professora e historiadora Lilia Moritz Schwarz:

"A história que contamos, e que chamamos de “universal”, é na verdade europeia, e masculina. Se quase não temos líderes femininas, o que dizer dos vários protagonistas negras e negros e dos e das indígenas? É preciso “descolonizar” nossa história e nossa imaginação; o que significa politizá-las. Pois bem, no dia 7 de junho, manifestantes que protestavam contra o racismo jogaram a estátua de Edward Colston no Rio Avon, sob aplausos. 

Inaugurada em 1895, ela homenageia esse traficante de escravizados e membro do Parlamento, que viveu de 1636 a 1721, em Bristol. Calcula-se que tenha traficado 80 mil pessoas entre as Áfricas e as Américas, das quais 20 mil morreram no caminho. O ato tem gerado muita repercussão. Enquanto o governo do primeiro-ministro Boris Johnson disse que a remoção foi um "ato criminoso", o prefeito de Bristol, Marvin Rees, afirmou que prefere deixar a estátua em um museu do que reinstalá-la. O tráfico de almas bem como o próprio sistema escravocrata correspondem a um dos capítulos mais sombrios da história. 

É certo que o tráfico não era considerado ilegal (até meados do XIX), mas fazer homenagem a um personagem como esse já é demais. Como os portugueses, os britânicos foram protagonistas desse comércio de pessoas entre os séculos XVI e XIX. Em 1807, o Império Britânico proibiu a atividade entre suas colônias. A escravidão só foi abolida, porém, em 1833. O movimento de revisão da História oficial também ganhou as ruas de outros países, como a Escócia e a França. Nos EUA, o movimento “decolonize this place”, (descolonize esse lugar) tem sido ativo na luta dentro dos museus. Não sou a favor de vandalismo mas sou a favor de mudar as páginas de nossa história e de nossa imaginação. O racismo foi criado por brancos, cabe portanto a nós atuarmos como “aliados” na luta anti-racista".