domingo, agosto 22, 2021

"Rio, Zona Norte", de Nelson Pereira dos Santos

"Rio, Zona Norte" é uma produção do ano de 1957, dirigida por Nelson Pereira dos Santos. Vi-o mês passado. Certamente, é um dos filmes brasileiros mais belos de todos os tempos. Uma obra-prima incontestável, digna do realismo italiano. A amargura da obra é adocicada pelo personagem Espírito da Luz, vivido pelo imenso Grande Otelo. Espírito como é chamado é um sujeito talentoso, lhano, um ser humano com características inimitáveis. Seu grande objetivo é gravar sambas com artistas como Ângela Maria, mas é "sacaneado" por alguém que se diz seu amigo. Por outro lado, o filho de Espírito se envolve com a criminalidade, dando desgostos imensuráveis ao pai. Nada parece dar certo para Espírito. Todavia, quando o personagem de Otelo canta os seus delicados sambas, algo grandioso acontece. A obra retrata com inigualável maestria a beleza da música popular. A trilha sonora do filme é de ninguém menos do que o compositor Radamés Gnatalli. É por meio de um enredo vivido a partir de reminiscências do personagem espírito que Nelson Pereira dos Santos critica as injustiças sociais existentes no país naquele período, ou seja, no quase final dos anos 50, mas ainda tão presentes em nossos dias. Filmaço! Recomendadíssimo! 

segunda-feira, agosto 16, 2021

"Nu, de botas", de Antonio Prata e algo mais

           

Sou assinante da Folha, algo sobre o qual, vez ou outra, ponho-me a pensar a respeito. Não é pelo dinheiro que emprego todos os meses. A quantia é módica. Sei que poderia direcionar o valor para uma mídia de esquerda. Sei da posição editorial do Grupo Folha; da canalhice dos interesses pró-mercado e, consequentemente, anti-país. Outra coisa, é o posicionamento político, que contribuiu acintosamente para o Golpe de 2016 e a chegada de Jair Bolsonaro ao poder.

   Acontece que a Folha, ainda, é um jornal que possui um time de colunistas de grande qualidade; jornalistas e escritores – alguns terrivelmente conservadores –, donos de grandes textos. Admiro um texto bem escrito; com aquela qualidade para o singularíssimo. Bem-humorado. Coeso.

Entre esses grandes colunistas está Antônio Prata. Cronista, escritor, jornalista, roteirista. E jovem. Possui apenas 43 anos. Alguém que com essa idade possui um dos textos mais bem escritos do jornalismo brasileiro. É sempre um grande aprendizado lê-lo. Domina os aspectos mais sutis da língua. Coloca a palavra no lugar certo. As sutilezas são ricamente empregadas, criando uma experiência sempre agradável o contato com os seus textos. 

Pois, foi com essa visão primária de alguém que acompanha os seus textos na Folha toda semana, que resolvi lê um dos seus livros. Escolhi “Nu, de botas”. Li-o no Kindle. Leitura rápida. Saborosa.

O livro remonta a infância do escritor. Busca retratar um quadro semi-memorialístico. É algo da grandeza do texto de Luís Fernando Veríssimo ou de um Fernando Sabino. É um texto cuja leitura realizamos de um só fôlego. Os capítulos são curtos. Enfocam os eventos próprios da infância de um sujeito de classe média, que viveu a infância nos anos 80. Estão lá os programas de televisão. A paixão pelos heróis japoneses. O palhaço Bozo, a Vovó Mafalda. A descoberta de coisas próprias da infância. A credulidade exagerada.  À medida que li, dei enormes gargalhadas. Não há como não se encher de uma enorme satisfação com o texto do escritor paulista.

Ao pegar um texto cuja matéria é o campo autobiográfico – ainda mais a infância- corre-se o risco de se tornar banal, piegas; ou quem sabe, irrelevante. Existem inúmeros escritores que escreveram obras-primas incontestáveis – Coetzee, Graciliano Ramos, Pedro Nava. Mas, o livro do Prata possui um outro sabor. É excelente. Vale a leitura!

Abaixo, um vídeo com uma entrevista do escritor, concedida ao médico Drauzio Varela.  

 


domingo, agosto 15, 2021

"A escavação", de Simon Stone.

 

“A Escavação” é um filme dirigido por Simon Stone, do ano de 2021. É uma obra, aparentemente, que não atrai. Possui um ritmo lento. Transmite a ideia de que se trata de um filme de época, à semelhança de uma produção inspirada em um romance de Jane Austen. Todavia, aos poucos os elementos inicialmente afastados começam a se juntar como se fossem uma peça de arqueologia com as partes separadas e que precisam ser juntadas; somos apanhados e ingressamos no drama. O filme é baseado em eventos reais. Conta a história do escavador (“arqueólogo) Basil Brown.  Brown inicia um processo de escavação no sítio da viúva Edith Pretty. 

 Esse evento particularmente vulgar vai ganhando contornos e cria uma trama repleta de reflexões bonitas sobre a arrogância, o orgulho, medo, incerteza e a fugacidade da vida. E tudo isso às vésperas da Segunda Guerra, já que a história se passa no ano de 1939. Há um trabalho bastante bonito no que diz respeito às cores do filme. Um belíssimo céu meio soturno; às vezes, com nuvens brancas e inquietas. Esse aspecto parece se ajustar à personalidade das personagens.  Um microcosmo de situações que se grudam aos objetos encontrados por Basil em sua escavação. Vale a pena ver!