terça-feira, novembro 27, 2018

A razão anti-intelectual

"Os conservadores estão de fato promovendo a organização da ignorância como se fosse uma emancipação democrática. É preciso reconhecer com humildade que estamos sendo derrotados neste jogo e mudar de postura para escapar da armadilha anti-intelectualista do populismo.


Nós, os progressistas, cultivamos o gosto pela sofisticação política e estética e, a cada rodada de conversação com nossos pares, nos diferenciamos mais, ficando mais requintados e com um repertório mais amplo. A cada rodada, tornamo-nos também mais estranhos e mais apartados das pessoas comuns.


Esse afastamento, que se acelerou com a polarização, permitiu aos conservadores nos apresentar como uma elite malévola que quer inculcar nas pessoas comuns valores alienígenas de defesa da diversidade e dos direitos humanos.

Precisamos abandonar essa disposição de falar apenas com quem se parece conosco e nos engajar com as pessoas comuns. Conversar, não converter. O verdadeiro desafio não é educar, mas se deixar educar.

Isso, por si só, pode dar a medida das prioridades e da gradação de que tanto carecemos se queremos transformar a sociedade, num sentido político e não apenas nos tornar mais puros, num sentido moral".

É assim que o professor Pablo Ortellado termina o artigo que tem por título "A armadilha do anti-intelectualismo", publicado na Folha de São Paulo. Organizar a ignorância, a mística e a paranoia como movimentos democráticos, faz parte de uma campanha mundial. Aqui no Brasil ela se consolidou com a eleição de Jair  Bolsonaro. O presidente eleito por si só não possui qualquer relação com o conhecimento, com a razão ou com a estética. Seu esporte mesmo é a bravata. A linguagem saturada por clichês que fazem apologia da violência e da insensatez bem ao gosto do homem comum. Ele ver comunistas como o eu lírico da música do Tihuana ver gnomos.

E nesse sentido é importante apontar uma ojeriza à racionalidade ou a qualquer coisa que nos aponte isso. Para perceber como isso se espraia num horizonte sombrio é só atentar para a forma como alguns ministros que vão compor o novo governo (sic.) foram escolhidos. Segundo os principais jornais do país, dois deles foram indicados por Olavo de Carvalho, uma espécie de Rasputin tropical. Enquanto o Rasputin original fazia predições mediúnicas e arrebatadoras para a família Romanov, Olavo se transformou no guru da família Bolsonaro. Sua verbalização sempre aponta para conspirações e está encharcada de arroubos infundados.  O atual movimento de consolidação hegemônica da extrema-deireita revela um surto anti-liberal e anti-iluminista. Há um ódio explícito a tudo que se diga racional, que será logo apontado como marxista, como comunista ou como gayzista. 

Os valores herdados pelo iluminismo - os direitos humanos, respeito às individualidades e às diferenças, a democracia, a separação dos poderes do Estado - são tidos como ameaçadores, pois há uma exaltação ao obscurantismo, uma ideia fixa que nos lança no fosso do irracionalismo. 

Vejamos aonde isso vai nos levar. 

terça-feira, novembro 20, 2018

O moleque Ricardo de José Lins do Rego - algumas impressões

Li há alguns dias o quarto livro do Ciclo da cana de açúcar - O moleque Ricardo. Meu objetivo é fazer a releitura dos cinco livros. Iniciei esta semana Usina, o quinto e último da série - e o maior deles. O moleque Ricardo é uma espécie de digressão dentro do Ciclo. José Lins foca a sua lupa sobre a vida do "moleque da bagaceira", Ricardo. Nos três primeiros livros, Carlos de Melo é o centro da trama. Em Menino de Engenho, vislumbra-se a vida bucólica e repleta de descobertas do neto de José Paulino, o maioral do Engenho Santa Rosa. Em Doidinho, a experiência do engenho muda para a escola em Itabaiana. O engenho aparece como relâmpagos no espaço da memória do jovem Carlos. Em Bangüe, Carlos de Melo volta da Faculdade de Direito do Recife para tomar conta do Santa Rosa, após a morte do avô. Sua fraqueza e inabilidade, colocam-no em posição delicada na administração da propriedade rural. Se levarmos em conta somente os três primeiros livros, Bangüe é o retrato mais poderoso desenhado pela pena do escritor paraibano. 

Em O moleque Ricardo, a narrativa não tem mais curso na vida rural. Dos livros do ciclo é o que mais se engaja numa perspectiva política. A história acontece em Recife. Migra da Paraíba para Pernambuco. Talvez, as impressões tenham sido colhidas por José Lins no período em que estudou Direito na capital pernambucana. José Lins deixa entender que a história de O moleque Ricardo é anterior ao que se dá em Bangüe. Nos acontecimentos políticos que sacodem a narrativa, nota-se a presença de Carlos de Melo. Ricardo e Carlos de Melo se encontram. Miram-se e mantêm uma posição equidistante. Ricardo, o morador de subúrbio; e Carlos de Melo, o herdeiro do senhor de engenho, mas que se dispõe no envolvimento da luta política como um intelectual que tomava causa.

A vida de José Lins enquanto estudante de Direito foi marcada pela estroinice. Todavia, suas viagens pela cidade, fê-lo observar a vida marginal que se brutalizava e resistia às margens do rio Capibaribe; ou nos inúmeros mangues que existem na cidade. Ali a vida dos "homens caranguejos", como chamaria mais tarde Chico Sciense, desenvolver-se-ia com toda luta e resistência em meio à lama e o caos.

O livro é marcado por essas dores, por esses cheiros; pela desejo veemente de contornar a miséria. Ricardo passa a morar em um subúrbio. Trabalha na padaria de um português - Seu Alexandre. Alcança certa tranquilidade com o seu trabalho. Consegue fazer economias. Administrar com destreza o pouco que ganhava na padaria. Aos poucos ele começa a perceber um fluxo, um movimento de contestação. Ricardo saído do Engenho Santa Rosa à procura de melhores condições de vida, percebe que a cidade é o espaço da liberdade. Todavia, é uma liberdade repleta de limites. Na grande propriedade rural "tudo" é do senhor de engenho - animais, terras, homens, árvores etc. Na cidade, há a crença de que há uma liberdade, mas há uma asfixia social baseada no lucro e na propriedade privada dos meios de produção, que transforma tudo em mercadoria. Ricardo era o negro, filho de Mãe Avelina. Descendente de escravos, representa a segmentação da sociedade brasileira. 

O livro escrito em 1935, denunciava a formação social brasileira. Após da decadência da grande propriedade rural e do fim da escravidão, para onde fora o negro? Qual é o seu destino? O que se esperava dele? As palavras as palavras finais do livro denunciam justamente "a apartação social" vivida pelo negro numa sociedade de classes. Ricardo estava sendo levado com os seus companheiros para Fernando de Noronha. Havia participado de uma manifestação e o Estado usava da força para abafar qualquer insurgência social. “[...] Que fizeram eles? Ninguém sabe não! Mataram? Roubaram? Queriam de comer, queriam vestir, queriam viver. E as mulheres? E os meninos? Também chorariam de fome". 

É  o livro de maior ressonância social de José Lins do Rego. Atende bem ao momento histórico em que se vivia - efervescência no cangaço, consolidação de uma burguesia nacional; decadência do agrarismo, principalmente com o café na região Sudeste e a cana de açúcar na região Nordeste; o movimento integralista brasileiro; a tentativa frustrada de um levante comunista. O governo Vargas que recrudesceria em violência, levando ao golpe de estado em 1937. No meio desses eventos, está o negro e sua luta. 

É curioso notar que José Lins cria dois mundos: o mundo da cidade com sua latejante desigualdade e o mundo bom e idílico do engenho. O engenho, a vida rural, como uma espécie de Éden que se perdeu. Alinha-se com o pensamento daquele que foi o preceptor de José Lins do Rego, o pernambucano Gilberto Freyre, que voltara dos Estados Unidos na década anterior e apadrinhara o escritor paraibano. Freyre procurou formar uma sociologia brasileira. Revelar a identidade nacional. Todavia, ao fazer isso, entendeu que o presente deformara o passado. Há uma "saudade implícita" pelo sobrado da Casa Grande na literatura de José Lins do Rêgo, talvez uma aspecto colhido da obra de Freyre. Vale lembrar que Casa Grande & Senzala havia sido escrito em 1933. O moleque Ricardo é de 1935.

A escrita de José Lins do Rego continua, como nos livros anteriores, correndo fácil. Nesse sentido, é um escritor plácido e agradável como as águas do rio Paraíba, tão presente em O menino de engenho. Não há empolações. Rebuscamentos. Exageros. José Lins transmite suas impressões como se estivesse numa conversa com os amigos. Bebemos cada palavra. Sentimos o sabor da linguagem. Percebemos as nuances simples da fala das personagens. E seguimos, atentando para casa paisagem.

terça-feira, novembro 13, 2018

A Reforma, o evangelicalismo brasileiro e as eleições

Os protestantes constituem uma massa complexa. É um grande tecido com cores variadas. No dia 31 de outubro passado, os países com tradição protestante, comemoraram 501 anos da Reforma. O dia da Reforma é comemorado neste dia pelo fato de o monge agostiniano Martinho Lutero ter pregado as suas 95 teses na Catedral de Wintenberg, na Alemanha. Começava a partir dali um outro movimento dentro da cristandade.

A Reforma foi um movimento antagônico à Igreja Católica e Apostólica Romana. Durante mais de mil anos, a Igreja Católica exerceu a primazia sobre a cristandade europeia. Havia acontecido o Cisma do Oriente, em 1054. Naquele episódio a Igreja Católica passou pela sua primeira grande divisão, dando origem à Igreja Ortodoxa ou Igreja do Oriente. 

O fato ocorrido em 1517, seguia a tendência modernizadora que ocorria na Europa. Havia um questionamento ao poder quase que absoluto da Igreja Romana. A vida desregrada de suas principais figuras gerava críticas. O aspecto soberbo do clero. A grandiloquência da vida e os casos de corrupção geravam escândalos. O Protestantismo era manifestação religiosa certa para o espírito da época. Experimentavam-se os primeiros ventos de um novo modo de produção - o capitalismo. Havia uma nova razão científica, o racionalismo. Aos poucos, a estrutura pesada da Igreja Romana foi sendo vista como um entrave às mudanças. 

A fé Reformada se assentava em cinco pontos, conhecido também como os Cinco Solas - sola fide (somente a fé); sola scriptura (somente a escritura); solus Christus (somente Cristo); sola gratia (somente a graça); e soli Deo gloria (glória somente a Deus). Cada "sola" abrigava um ensinamento teológico profundo, que destoava dos ensinamentos do catolicismo. Por exemplo, no primeiro apresentado da lista ("sola fide"), trazia a doutrina da salvação pela fé, extraída de Romanos 1.17. Foi a leitura desse versículo, que deu a Lutero a certeza de que não era necessário nenhum sacrifício a mais para se alcançar a salvação. Ter fé na obra de Cristo era suficiente para ter uma vida cristã saudável. A justificação foi realizada, pois o amor de Deus e a obra (unicamente de Deus), por intermédio da morte de Cristo, é o suficiente para a vida plena. Não há necessidades de intercessão de santos, da obra espiritual da Igreja ou qualquer outro sacrifício. 

No "sola scriptura", havia uma importância profunda pelo fato de a Bíblia, no catolicismo, ser lida apenas pelos padres e pelas autoridades da Igreja. A partir da Reforma, os cristãos passaram a examinar as Escrituras (o Velho e o Novo Testamentos). Durante o período hegemônico do catolicismo, a Bíblia ficava escondida nos mosteiros. A interpretação era filtrada. A Reforma colocou a Bíblia nas mãos do povo. A invenção de Gutenberg também auxiliou esse fato, pois os livros passaram a ser produzidos em escala.  O primeiro livro por Gutenberg foi justamente as Escrituras. Para os protestantes, ela era a única palavra inspirada por Deus. Ela mesma era a sua intérprete. Ela dava testemunho de si, não havendo necessidade de entremeios. 

Para aqueles sujeitos que foram responsáveis pela Reforma, havia uma preocupação profunda com a defesa do Evangelho. Levava-se em conta aquela fala de Paulo: "Ai de mim se não pregar o Evangelho". (1 Co 9.16). 

Curiosamente, após quinhentos anos, as igrejas que surgiram da Reforma perderam a relevância. Na Europa, o protestantismo não passa pelos seus melhores dias. Nos países em desenvolvimento, entre eles o Brasil, a fé de origem protestante enfrenta um fenômeno complexo: 

(1) Possui quantidade, mas não possui a qualidade desejada pelos reformadores - os últimos censos realizados no Brasil, mostram claramente o crescimento vertiginoso do número dos ditos protestantes. Todavia, a fé protestante experimentada por aqui vive uma espécie de esquizofrenia.  O movimento protestante teve a sua origem na Europa. Foi para os Estados Unidos e acabou ganhando o mundo. Ou seja, a fé protestante vivida por aqui está numa terceira fase (sem mencionar a divisões já surgidas dentro do protestantismo brasileiro). Junto com o protestantismo estadunidense veio a teologia de mercado, também conhecida como teologia da prosperidade. A teologia da prosperidade é a racionalidade do neoliberalismo aplicada ao fenômeno religioso. Ou seja, a fé evangélica, conforme entendida pelos reformadores, pautada nos ensinamentos de Cristo, perdeu a centralidade. O que vale mesmo é a preocupação com aquilo que a fé pode proporcionar. A fé não possui qualquer relevância social. É muito conhecida história a seguinte história: certo dia, alguém que se convertera chegou para Lutero e perguntou:

- Lutero, eu era sapateiro antes de me converter. Agora que sou convertido, como eu devo viver?" O monge agostiniano respondeu:
- Vai para o trabalho e faz o melhor sapato que conseguir.

Esta história serve para ilustrar o quanto a teologia da prosperidade é esvaziada de relevância social transformadora. O centralismo do ganho sobrepõe-se sobre a práxis cristã ensinada por Cristo.

(2) Estrutura-se na conformação do dogma, e não na dinâmica viva dos ensinamentos de Cristo - há inúmeras passagens nos evangelhos em que notamos a dinâmica viva do ensinamento de Cristo e a conformação com o dogma, com a tradição que, com o tempo, transforma-se em um evento sagrado. Jesus em vários momentos chamou a atenção dos religiosos do seu tempo. Para ele, os religiosos haviam perdido a referência fundamental da fé, que é a vida humana. Um exemplo se deu quando Cristo falou para os fariseus "que o homem não foi feito por causa do sábado; mas, o sábado, sim, foi feito por causa do homem". As necessidades, as dores, os dilemas humanos estão acima do dogma. Os fariseus tinham o sábado como um dogma cujo mandamento não poderia ser violado. Caso, alguém caísse em um buraco em dia de sábado, deveria ficar lá até o outro dia para que o mandamento não fosse suplantado. Jesus inverte essa compreensão. A vida estava em primeiro lugar em relação ao mandamento. Nota-se a igreja protestante atuando bem próxima da compreensão dos fariseus. Para ela, o moralismo da interpretação do dogma está acima das necessidades de cada de ser humano.

(3)  Conforma-se em conservar estruturas, ao invés de desafiar aquilo que é velho - existe uma razão no evangelicalismo, que o impele a não desafiar as estruturas de injustiça do mundo. Há um conformismo com as estruturas de opressão. Do ponto de vista político, a fé protestante coloca-se do lado do opressor e não do oprimido. Fazer trabalho social para muitas igrejas é distribuir sopa em hospital ou debaixo da ponte. Essas são ações imediatas e necessárias. Todavia, não se questiona o que leva as pessoas a estarem debaixo da ponte ou morando em calçadas úmidas. A fé protestante furta-se da defesa dos direitos humanos. Para ela, como foi afirmado por alguém, o importante é defender "os humanos direitos". Ela acaba por escolher um lado. Cristo afirmou certa vez que não veio para os sãos, mas, sim, para aqueles estavam doentes. Sua mensagem era transgressora, pois relativizava o poder religioso estabelecido à época.

(4) O fundamentalismo impede que os evangélicos sejam relevantes para a sociedade - o fundamentalismo religioso dos protestantes impede qualquer possibilidade de relativização. Ela se veste de uma compreensão absoluta, inegociável, eterna, imutável para além da história. Nas temáticas mais variadas, o que importa é a compreensão dogmática sobre o assunto. O fundamentalismo trabalha com a ideia de culpa e medo. Não seguir os ditames impostos pela linguagem religiosa, faz com que o crente se enxergue como um ser digno de condenação. Trata-se de um mundo em que a linguagem exerce uma coerção psicológica para que tudo seja medido. Tudo aquilo que esteja fora do padrão cultural estabelecido como aceitável é um assunto tabu, proibido, tido como pecaminoso. De onde surgiram tais mandamentos? Como se estrutura, qual a origem dessa linguagem dogmática? Muitas das compreensões sobre os padrões morais - o papel da mulher, como deve ser a relação, o namoro; a figura da homoafetividade; o modelo ético - são extraídos da cultura judaica. Dogmatizam-se os preceitos culturais, dando-lhes feições divinas, absolutas. O fundamentalismo, desse modo, acaba por alimentar a intolerância, pois não consegue dialogar com quaisquer outras manifestações religiosas. Há uma exigência, uma luta pela consolidação hegemônica visão protestante. A linguagem fundamentalista é totalizadora, pois não permite relativizações. Ela, simplesmente, impõe sem que haja tempo para dúvidas.

Sobre este ponto, as eleições presidenciais deste ano provaram isso de forma inquestionável. A figura do candidato vencedor, Jair Bolsonaro, era controversa. Ele é o típico indivíduo fundamentalista. Sua intolerância ou brutalização em torno de certas temáticas, explicitavam o quanto ele não estava/está disposto ao diálogo. Sua defesa da violência contra aqueles tidos como vagabundos ou, simplesmente, direcionados às mulheres, deixava qualquer pessoa com um senso de justiça, completamente estarrecido. Pois, boa parte dos cristãos evangélicos, escolherem essa figura caricata e insensível. Em nome de quem ou do quê? Dos bons costumes, da família tradicional e de um ódio ao diferente.

quinta-feira, novembro 01, 2018

Um comentário...

Curiosamente, as reportagens que são feitas nunca colocam a fala de alguém que se opõe à suposta quebra da previdência. Observem. Só há falas afirmando que a previdência está em colapso. É como se o trabalhador fosse o responsável pelo rombo nas contas públicas. Não há a explicação, por exemplo, sobre onde está localizada e o que é a previdência e como ela é sustentada. A previdência é apenas umas das pernas da Seguridade Social, que compreende a assistência social, a saúde e a previdência social. Quando os constituintes de 88 criaram a Seguridade Social, pensaram sobre ela iria se manter. Então, entraram os seguintes personagens: o trabalhador contribui com parcela do salário (INSS); os empregadores pagam o CSLL (imposto sobre o lucro) e o imposto sobre a folha; e toda a sociedade com a COFINS (imposto embutido sobre tudo o que se adquire). Então o que acontece? O governo maquia as contas. Em primeiro, lugar há uma separação. 

A previdência é colocada de lado, transparecendo o seu peso para o equilíbrio das contas públicas. Por que eles não falam que as contas da saúde estão quebradas ou da assistência - pelo menos por enquanto? Pelo simples fato de que os valores da previdência não podem ser canalizados para outros setores. São gastos vinculados, condicionados. Eles não podem desviar para pagar, por exemplo, os juros da dívida pública. Paulo Guedes disse que o Brasil reconstrói uma Europa todos os anos com os juros da dívida. Ele é um grande hipócrita, pois, ele, como banqueiro, lucra justamente disso. Assim, o governo quando vai fazer a conta, utiliza apenas a arrecadação do INSS. Ou seja, o que é arrecadado da contribuição dos trabalhadores. Desse jeito, a conta não fecha mesmo. E outra, o governo adora fazer desonerações para as grandes empresas. Em grande sentido, atualmente, somente os trabalhadores mantêm a previdência. 

A desculpa para a reforma nos moldes que eles querem fazer é rasgar o preceito constitucional da solidariedade. Atualmente, ela é mantida a assim. Quem trabalha, paga para aqueles que já estão aposentados. Mas, chegará o dia em que nos aposentaremos e aí as gerações mais novas contribuirão para que as aposentadorias sejam mantidas. A Manu, o Bernardo, o Miguel serão os responsáveis pelas nossas aposentadorias, se tudo se mantiver como está. O que o novo governo que fazer é acabar com este princípio. Primeiro, quer tirar das empresas o imposto sobre a folha e desobrigá-las a qualquer tipo de contribuição. O governo vai chegar para cada um e falar: "Queridão, você quer se aposentar?. Então faz uma capitalização". O trabalhador vai retrucar: "Mas eu ganho pouco. Como eu vou pagar?" O governo vai responder: "Paga o que você pode". Ou seja, a capitalização vai ser injetada em um banco e o banco vai transformar em papel e aplicar no mercado financeiro para gerar lucro". No fundo, há uma grande mentira por parte do governo para tirar dos empresários qualquer compromisso e, dele mesmo, qualquer despesa com o trabalhador. O fundo público vai ser revertido para pagar os papéis dos juros da dívida.