segunda-feira, março 29, 2010

Renato Russo, trovador de uma legião

No último sábado, dia 27 de março, foram comemorados os 50 anos do nascimento de Renato Manfredini Júnior, mais conhecido como Renato Russo. Não gostaria de externar aqui apenas informações ou descrições de cunho generalizante – como tantos fizeram nessa data. Antes de tudo, é necessário afirmar que Renato Russo foi alguém que nutriu as esperanças juvenis de uma geração sonhadora. Durante grande parte de minha adolescência, eu me vi cercado pelas suas letras, que revelavam os melhores dos mundos – poesia de sonhos, amores juvenis, revolta contra a ingerência dos pais, de paixão e respeito ao próximo.
Renato embalou o sonho dos adolescentes e de uma geração de indivíduos conscienciosos de todas as idades. O que me atraía em Renato Russo era sua sensibilidade, sua inteligência. Tal capacidade fora construída por muitas leituras e pela relação apaixonada que nutria pelo o rock inglês (de bandas como Beatles, Sex Pistols, Rolling Stones, Joy Division, The Clash) ou pelo rock folk americano (Neil Young e Bob Dylan). Havia em Renato uma veio apuradíssimo de criticidade, resultado de suas leituras, que muitas vezes ficavam explícitas em suas letras. Música como “Tempo Perdido”, talvez uma referência clara ao livro do escritor alemão Thomas Mann “Em Busca do Tempo Perdido”; ou ainda o nome do álbum “A Tempestade”, quiça aqui, um apontamento para “A Tempestade” de William Shaskepeare; ou ainda, o nome do álbum “As Quatro Estações”, surja como uma referência indireta à famosa peça do compositor italiano Antonio Vivaldi.
Renato era um burguês culto. Apregoava que fazia parte de uma geração onde o que prevalecia era a condição da burguesia moralista sem religião. Que os signos da nova ideologia eram o desmantelamento do bom senso. Éramos filhos de uma geração Coca-Cola. E que fomos programados desde o nascimento para repetirmos fórmulas mecânicas. Uma geração que era alimentada pelo lixo industrial e comercial. Comedores de enlatados produzidos por fast-foods. E que passados 20 anos na escola não era difícil de aprender tais artimanhas. O resultado dessa digestão seria o vômito anárquico e cínico. Leis não obedecidas, alegorias picarescas, referências esdrúxulas. Tudo isso seria posto em cena por uma legião que querendo ou não é “o futuro da nação”. Ou em outras palavras, qual seria o futuro da nação, quando os construtores dessa possibilidade mataram os referencias e se alimentam pelo lixo industrial do capitalismo, quando são apenas uma “geração coca-cola”? É uma letra de gênio, de um poeta fino que faz política com arte. Outras letras como das músicas “Fábrica”, “Perfeição” ou “A Canção do senhor da Guerra”, também possuem traços de grande contundência política e social.
Uma vez ou outra volto às suas músicas, assim como a legião de fãs que ainda continua manter viva a memória de sua capacidade. Ouvi-lo é gestar em nós a possibilidade de sonhar com melhores dias. É voltar a ser adolescente e nutrir aqueles idealismos que preservam e sustentam o fato de acordarmos todas as manhãs e termos esperança. Renato Russo foi o trovador de uma geração que queria/quer se encontrar, mas não sabe onde estava/está. “E há tempos/ Nem os santos têm ao certo/ A medida da maldade/E há tempos são os jovens/ Que adoecem/ E há tempos/O encanto está ausente/ E há ferrugem nos sorrisos/ Só o acaso estende os braços/ A quem procura/
Abrigo e proteção”. Ele cantou para uma legião que tem o grito represado na garganta e o grito é equivalente à imensa dor que sente e, se esse grito vier/viesse à tona, poderia acordar o mundo inteiro.
Parabéns pelos 50 anos do nascimento desse poeta de grande expressão. Sua voz continua a gritar em nossos corações. Suas poesias continuam a serem embaladas pelo vento como grandes bandeiras que dão identidade a uma geração tão perdida em si mesma. E o certo é que o “o nosso dia vai chegar/ teremos nossa vez”. Grande sonho, esperança e utopia.

Por Carlos Antônio M. Albuquerque
Data: segunda-feira, 29 de março de 2010, 11:12:47

sexta-feira, março 26, 2010

Pessimismo capitalista e Darwinismo social

Que fazer quando uma crise como a nossa se transforma em sistêmica, atingindo todas as áreas e mostra mais traços destrutivos que construtivos? É notório que o modelo social montado já nos primórdios da modernidade, assentado na magnificação do eu e em sua conquista do mundo em vista da acumulação privada de riqueza não pode mais ser levado avante. Apenas os deslumbrados do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo Lula, acreditam ainda neste projeto que é a racionalização do irracional. Hoje percebemos claramente que não podemos crescer indefinidamente porque a Terra não suporta mais nem há demanda suficiente. Este modelo não deu certo, pelas perversidades sociais e ambientais que produziu. Por isso, é intolerável que nos seja imposto como a única forma de produzir como ainda querem os membros do G-20 e do PAC.

A situação emerge mais grave ainda quando este sistema vem apontado como o principal causador da crise ambiental generalizada, culminando com o aquecimento global. A perpetuação deste paradigma de produção e de consumo pode, no limite, comprometer o futuro da biosfera e a existência da espécie humana sobre o planeta.

Como mudar de rumo? É tarefa complexíssima. Mas devemos começar. Antes de tudo, com a mudança de nosso olhar sobre a realidade, olhar este subjacente à atual sociedade de marcado: o pessimismo capitalista e o darwinismo social.
O pessimismo capitalista foi bem expresso pelo pai fundador da economia moderna Adam Smith (1723-1790), professor de ética em Glasgow. Observando a sociedade, dizia que ela é um conjunto de indivíduos egoístas, cada qual procurando para si o melhor. Pessimista, acreditava que esse dado é tão arraigado que não pode ser mudado. Só nos resta moderá-lo. A forma é criar o mercado no qual todos competem com seus produtos, equilibrando assim os impulsos egoístas.
O outro dado é o darwinismo social raso. Assume-se a tese de Darwin, hoje vastamente questionada, de que no processo da evolução das espécies sobrevive apenas o mais forte e o mais apto a adaptar-se. Por exemplo, no mercado, se diz, os fracos serão sempre engolidos pelos mais fortes. É bom que assim seja, dizem, senão a fluidez das trocas fica prejudicada. Há que se entender corretamente a teoria de Smith. Ele não a tirou das nuvens. Viu-a na prática selvagem do capitalismo inglês nascente. O que ele fez, foi traduzi-la teoricamente no seu famoso livro: "Uma investigação sobre a natureza e as causas da riqueza das nações"(1776) e assim justificá-la. Havia, na época, um processo perverso de acumulação individual e de exploração desumana da mão de obra.
Hoje não é diferente. Repito os dados já conhecidos: os três pessoas mais ricas do mundo possuem ativos superiores à toda riqueza de 48 países mais pobres onde vivem 600 milhões de pessoas; 257 pessoas sozinhas acumulam mais riqueza que 2,8 bilhões de pessoas o que equivale a 45% da humanidade; o resultado é que mais de um bilhão passa fome e 2,5 bilhões vivem abaixo da linha da pobreza; no Brasil 5 mil famílias possuem 46% da riqueza nacional. Que dizem esses dados se não expressar um aterrador egoísmo? Smith, preocupado com esta barbárie e como professor de ética, acreditava que o mercado, qual mão invisível, poderia controlar os egoísmos e garantir o bem estar de todos. Pura ilusão, sempre desmentida pelos fatos.

Smith falhou porque foi reducionista: ficou só no egoísmo. Este existe, mas pode ser limitado, por aquilo que ele omitiu: a cooperação, essencial ao ser humano. Este é fruto da cooperação de seu país e comparece como um nó-de-relações sociais. Somente sobrevive dentro de relações de reciprocidade que limitam o egoísmo. É verdade que egoísmo e altruísmo convivem. Mas se o altruísmo não prevalecer, surgem perversões como se nota nas sociedades modernas assentadas na inflação do "eu" e no enfraquecimento da cooperação. Esse egoísmo coletivo faz todos serem inimigos uns dos outros. Mudar de rumo? Sim, na direção do "nós", da cooperação de todos com todos e na solidariedade universal e não do "eu" que exclui. Se tivermos altruísmo e compaixão não deixaremos que os fracos sejam vítimas da seleção natural. Interferiremos cuidando-os, criando-lhes condições para que vivam e continuem entre nós. Pois cada um é mais que um produtor e um consumidor. É único no universo, portador de uma mensagem a ser ouvida e é membro da grande família humana. Isso não é uma questão apenas de política, mas de ética humanitária, feita de solidariedade e de compaixão.

Por Leonardo Boff

Extraído DAQUI

sábado, março 20, 2010

Porquê Celebrar o Equinócio de Outono?

Dia 20 de Março é o Equinócio de Outono no hemisfério sul; dentro de dez dias entramos nas estações frias (ao menos aqueles que vivem mais longe do Equador). O outono, como a primavera, é uma estação de mudança; no entanto, enquanto a primavera tem cheiro de renovação e gosto de renascimento, o outono é uma época mais introspectiva, que nos chama a prepara-nos para o período mais escuro e frio do ano.

As celebrações já não são as mesmas de antigamente

Antigamente, a transição das estações era uma parte importante da vida. Os equinócios e solstícios eram celebrados, não só por motivos religiosos, mas porque a vida diária era diretamente afetada pela natureza, pelo clima. Hoje em dia, com o ar condicionado, a calefação, a urbanização e a produção industrial, essas celebrações se perderam. O passar das estações perdeu significado e importância. O que é uma pena. Porquê Celebrar o Equinócio de Outono? Uma pena porque com isso uma parte de nós se perdeu – principalmente para as mulheres. Essas celebrações nos ajudavam a conhecer e compreender os ciclos da vida, da natureza, de nosso próprio corpo e espírito.

Celebrar é uma Necessidade

Apesar da modernidade, ainda sentimos necessidade de ter esse conhecimento e essa compreensão, embora estejamos imersas na massificação da sociedade industrial de consumo, onde todos os dias, meses e anos são iguais – desprovistos de significado. Um bom exemplo disso é o fim do ano – o excesso das festas, de compras, de comida e bebida, a fúria das resoluções de ano novo, que logo caem no esquecimento. Nos entregamos à esses excessos, porque já não sabemos como celebrar de forma adequada, de forma a encher-nos a alma (e não somente a barriga).Sentimos a necessidade de celebrar, de marcar a passagem do ano, de encerrar um ciclo – mas não sabemos como.

Ritos de Passagem são Terapêuticos

Celebrações são (ou deveriam ser) ritos de passagem. Assinalam o final de um ciclo e o começo de outro, nos situam no contexto do todo, inserem nosso micro-cosmo pessoal dentro do macro-cosmo Vida.Nos convidam a olhar para trás, para o ciclo que está finalizando, e descobrir o que aprendemos, quais foram nossos erros e nossos acertos; e nos dão informação sobre o próximo ciclo, sugerindo como deveremos agir, quais deverão ser nossos próximos passos. Porquê Celebrar o Equinócio de Outono? Prestar atenção nos ciclos, entendê-los, honrá-los e celebrá-los é extremamente terapêutico. Essas práticas restabelecem a conexão com nós mesmas, nos dão alegria, paz e tranquilidade. Recuperar essas tradições de passagem, esses ritos e celebrações, essa forma de contar o tempo, só depende de nós. Você não precisa se fantasiar de bruxa e acender uma fogueira no meio do mato, para recuperar a magia e o significado dessas celebrações.

Extraído DAQUI.

quinta-feira, março 18, 2010

O retorno da razão?

Os Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) acabam de eleger Cezar Peluso presidente da casa no biênio 2010-2012. Baseado no modelo dos Estados Unidos, como desejava o imperador dom Pedro II, concretizado com a primeira Constituição republicana, de 1891, o STF anda a precisar de uma reformulação. Exemplo: estabelecer prazo de mandato para os ministros, sem direito à recondução, conforme o padrão europeu. Este, aliás, mais democrático e que melhor atende aos interesses dos cidadãos.
Em boa hora chega o independente, preparado e reservado ministro Peluso ao cargo, pois, como bem observou o colunista Wálter Maierovitch, o presidente Gilmar Mendes foi uma tragédia constitucional. Um ministro, principalmente à frente da corte, não pode prejulgar, quebrar o princípio da harmonia e independência dos Poderes, fazer denúncias sem provas (caso da escuta telefônica sem áudio), “chamar às falas o presidente da República”, exigir a cabeça de servidores (vide Paulo Lacerda) e opinar sobre matérias que não dizem respeito ao Judiciário.
Peluso, com formação de magistrado e atuação exemplar como juiz e desembargador, tem experiência e discernimento suficientes para lograr e restabelecer o prestigio do STF. Talvez volte a ser possível repetir uma frase do saudoso jurista Píero Calamandrei: “As qualidades dos magistrados excedem de modo notável os seus defeitos”.

A volta da razão? – Revista Carta Capital, edição no. 587, p. 20

sábado, março 13, 2010

200 anos do nascimento de Chopin

Dia primeiro de março, o mundo comemorou duzentos anos do nascimento de Frédéric Chopin, um dos principais nomes da história da música. Há certa discussão em torno da data exata do nascimento do compositor. Alguns historiadores afirmam que Chopin teria nascido em 22 de fevereiro; outros, em primeiro de março. A grande questão é que Chopin é uma figura importante para a composição pianística. As caractétiscas esboças em sua música, torna-a em algo inconfudível. Suas composições estão cheias de melancolia, de tons e acetinações ocasuais; de leveza, frescor, dúvida, lembranças, tristeza e fúria.
Chopin nasceu na Polônia, país do leste europeu. Mais tarde abrigaria outros nomes importantes das artes. Franz Kafka, por exemplo. No século XX, temos o nome de Penderecki. Ainda muito novo (e isso antes do vinte anos de idade), Chopin compôs seus dois concertos para piano e orquestra. São dois concertos da mais alta distinção. Estão entre os principais que já foram compostos. São doces, introspectivos, tristes, liricamente impecáveis. O de número 1 foi composto por último e o número 2, primeiro. Essa alternância é meramente classificatória. Dono de uma personalidade sensível, de compleições e gestuais recatados, Chopin muda-se para a França. Lá faz sucesso. Seus trejeitos chamam a atenção dos franceses. Toca nos cafés e quando isso acontece, o público silencia para ouvir a sua música, emotiva, com cargas tocantes de grande beleza. À época não havia gravações como as de hoje. Para que o artista tornasse conhecida a sua arte, era necessário que ele tivesse pessoas que a apresentasse; ou que ele mesmo fizesse isso. Sua saúde era frágil. Dos trinta anos em diante, percebe-se um agravamento em sua condição. A tuberculose pouco a pouco o fulmina. Vive à procura de melhores ares para "estancar" o seu problema crônico. Teve um caso sentimental com George Sand. Morre aos 39 anos, ainda muito novo. O fato é que o mundo não poderia ficar privado da singularidade Chopin. Suas polanaises, mazurkas, noturnos, estudos, beceuses e outros, possuem tons identitários. É fácil ouvir e afirmar: "É Chopin!"

Por Carlos Antônio M. Albuquerque
Data: Sábado, 13 de março de 2010.