domingo, maio 21, 2017

"O Capital" (2011), um filme de Constantin Costa-Gavras

A mulher de Marc pergunta: - "O que você quer?"
Ele responde: "Dinheiro!"

O filme O Capital (2011), do cineasta greco-francês, Constantin Costa-Gavras, é uma reflexão profunda e brutal de como o capital financeiro domina o mundo. Costa-Gavras ao longo da carreira tem produzido filmes sempre buscando estabelecer algum tipo de debate político. Se não me engano, este é o segundo filme que vejo dele. O primeiro foi Amem (2002), que foca na indiferença consentida da Igreja Católica em relação às medidas diabólicas nazistas contra os judeus.

Em O Capital, encontramos as lentes do diretor fazendo-nos refletir como se dão as relações no mundo do capital. O pano de fundo, certamente, foi a crise que abalou os mercados no ano de 2008 e que continua a promover as suas consequências. Quando falamos em filmes que buscam retratar o cenário de poder do mundo capitalista é sempre bom lembrar Wall Street - poder e cobiça (1987), de Oliver Stone, e outro mais recente: A grande aposta, (2015), de Adam McKay, que revela o background da crise com a eclosão da bolha especulativa do ano de 2008. 

O Capital intriga por nos fazer entrar no mundo das especulações, do capital intangível, virtualizado, imaterial e que não está preocupado com a produção de riqueza social. A lógica do capital é a transformação dele mesmo, gerando lucros cada vez mais absurdos. O poder do capital é a força que muda, manipula cenários a fim de que ele mesmo prevaleça acima de tudo e todos. 

Marc Tourneuil é um jovem inteligente e ambicioso. Ele assume a presidência de um dos maiores bancos europeus, o Banco Prenix, quando o seu presidente-fundador - Jack Marmande - se ver impossibilidade por causa de um câncer nos testículos. O nome do banco faz referência à ave mitológica capaz de ressurgir das cinzas cada vez que morre. O capital também sempre ressurge após as suas crises, exibindo novas feições para objetivar o lucro. O cargo era almejado por diversos integrantes do conselho deliberativo do banco. Aos poucos, Marc vai mostrando suas habilidades como gestor, tendo que tomar decisões difíceis como, por exemplo, a demissão de um número considerável de funcionários para que o banco se tornasse mais rentável. No filme, fica claro que o banco passa por uma valorização na bolsa de valores, feita pelos investidores, após o corte de dezenas de milhares de vagas de emprego.

A personagem rapidamente percebe o jogo que se arma contra ele. Nesse sentido, é importante prestar atenção à cena inicial do filme, que mostra uma tacada de golfe realizada por Jack Marmande. Ou seja, o mundo frio, instrumental do dinheiro, é um verdadeiro jogo. Para prevalecer nele é preciso saber jogar. Dentro desse espaço, não há lugar para as relações, que passam a ser sempre interesseiras e pragmáticas. 

O filme deixa-nos a impressão de que o contato humano passa a ser sempre artificial e virtual. Marc vive a viajar em jatinhos e se locomovendo de um espaço a outro em limusines como se não houvesse qualquer necessidade do homem social, o homem das relações humanas, que enxerga no outro a imagem de si. Quando ele fala é sempre por meio de uma tela ou de um aparelho celular. Esse excesso de virtualidade no filme é para mostrar quanto que o capital também se metamorfoseou em imaterialidade. 

As objetivações supremas do espírito humana ficam sempre secundarizadas. Notam-se no filme quadros de artistas como Matisse ou Modigliani.  O capital perdeu a sua materialidade e se tornou mera ficção a se converter em papéis, em títulos virtuais, em movimento especulativo que não gera riqueza para a sociedade por não ter preocupação com o trabalho. Esse movimento implacável, é resultado das sucessivas crises que o próprio capital tem acumulado desde a década de 70. Para que tivesse sobrevida e alcançasse seu objetivo supremo - o lucro - ele precisou espoliar-se das amarras sociais do estado de bem-estar-social, principalmente com uma das suas faces atuais, o neoliberalismo. 

Hoje, no Brasil, vemos esse jogo cada vez mais com força e factibilidade desde o golpe contra a presidenta Dilma, em 2016. O golpe foi para dar força e lucro ilimitado ao capital. As forças que patrocinaram o golpe partiram do capital financeiro e seus diversos braços. As ditas "reformas" trabalhistas realizadas a contragosto pelo governo ilegítimo de Michel Temer, um serviçal invertebrado do sistema capitalista, sem expressão, fraco, débil de carisma, intentam justamente extrair as amarras para que o capital seja sempre mais forte e soberano. Não há preocupação com os trabalhadores, que passam a ser meras peças acessórias, facilmente substituíveis. Precariza-se o trabalhador, pelo fato de o financismo não está preocupado com o trabalho. As ilusões com o trabalho passaram a ser coisas do passado. Os sindicatos, como instituições que representam e protegem o trabalhador, perdem a musculatura. Transformam-se em grêmios anêmicos, sem forças, e, finalmente, em uma realidade desnecessária, já que o capital não deseja obstáculos quaisquer. 

Em dado momento, encontramos essa pérola no filme que serve como reforço argumentativo. Quando Marc está conversando com acionistas estadunidenses, estes buscam tornar a face francesa do banco Phenix cada vez mais rarefeita, pois a França é o país das regulamentações que incomodam o capital financeiro-parasitário: "Gostam de Paris, mas não da França. Muitas leis sociais". Nota-se, aqui que a palavra "regulamentar" possui uma essência que torna exata o jogo do capital. O Capital especulativo está sempre mudando de lugar; sempre procurando locais mais atraentes, independemente da geografia. Qualquer ameaça a ele, ele voa, some, desaparece em lances céleres. As crises surgem assim. 

As reformas do trabalho, que também possuem o título eufemístico-dourado de "modernização das leis trabalhistas", são, no fundo, a face mais grotesco do jogo manipulador do capital em busca de mais lucro. As leis trabalhistas retiram do capitalista o seu principal desejo: ter mais dinheiro. No filme, só há uma referência a sindicatos. O que notamos é a onipresença poder da ontologia do capital, que é uma força em si e para si. 

Claro, existem outros elementos no filme, que poderiam ser abordados. À medida que fui lembrando, coloquei os que foram abordados acima. verdadeiramente, um filme espetacular.

sábado, maio 20, 2017

Inquilinagem

Semana passada fiz algumas compras em sites como a Amazon, Livraria 30porcento e Estante Virtual. Fui constantemente abordado pelo porteiro do prédio onde moro todos os dias ao chegar do trabalho. Somou-se um quantitativo considerável que, ligada à lista de que disponho para ler, aguçou ainda mais meu desespero. Dando quarenta aulas por semana, sem mencionar a preparação e a correção de trabalhos e provas, o que resta dessa maratona é um organismo inerme, fatigado. A coisa anda tão absurda que já não tenho tempo para escrever neste espaço. Colocarei abaixo alguns  dos títulos que chegaram e que serão objetos de leitura pelos meses e anos vindouros.

 Walter Benjamin - Rua de Mão Única - Tomo II

Guerra e Revolução - o mundo um século após Outubro de 
1917 - D. Losurdo

Contos Reunidos - F. Dostoiévski

A Casa dos Carlyle - Virginia Woolf

Teoria Geral do Direito e Marxismo - Pachukanis















Fogo Pálido - V. Nabakov
O Leilão do Lote 49 - T. Pynchon

Pedro Páramo - Juan Rulfo

O ruído do tempo - Julian Barnes
O jogo de olhos - Elias Canetti

Mimesis - E. Auerbach
A mansão - W. Faulkner

O povoado - W. Faulkner
A cidade - W. Faulkner

Massa e poder - Elias Canetti
A pessoa em questão - V. Nabakov