Pensador da cultura, Nietzsche possuía um tipo de sobriedade que não se encontra originariamente em outro pensador. Sua linguagem não é hermética, carregada de empolações sistemáticas, o que o torna convidativo desde a primeira página. Nietzsche não quis escrever para um clube seleto de especialistas guardados em torres de cristal, completamente afastados do mundo.
O filósofo queria encontrar verdadeiros pensadores, verdadeiros homens, mas não os encontrou. O mundo está repleto de mimetismo, de símios ideais. “Fala o desiludido: ‘Eu buscava grandes homens e sempre achei apenas os macacos’”.
O que me impressiona em Nietzsche é fato dele não ser apenas um filósofo, conforme as implicações da palavra. O pensador alemão é, também, um poeta. Seus livros são, antes de tudo, verdadeiras fontes de riqueza literária. Sua linguagem é curta e cortante. Ele não perde tempo. Ataca em todo tempo, mesmo nos momentos de imenso lirismo. Podemos ler os capítulos ou porções de capítulos separadamente sem que isso afete a compreensão daquilo que estamos lendo. Certamente isso é uma forma diferenciada de escrever sobre temas complexos, mas numa linguagem na qual não é difícil compreender. Afirmação interessante pode ser encontrada em “O Crepúsculo dos Ídolos”: “...minha ambição é dizer em dez frases o que qualquer outro diz em um livro – o que qualquer outro não diz em um livro”. Cultor do aforismo, Nietzsche se distingue ainda dos demais filósofos pela plasticidade literária que empregou a essas “estruturas textuais”. “...jamais fui modesto o bastante para exigir menos de mim. O aforismo, a sentença, nos quais sou o primeiro a ser mestre entre os alemães, são as formas da eternidade”.
O professor da PUC-SP e da UNIRIO, Willis Santiago Guerra Filho, afirma de forma embelezante: “O aforismo sempre viveu na fronteira entre a poesia e a filosofia. Se a origem do aforismo no mais das vezes é espontânea como a da lírica, ele pensa o mundo com a consciência extrema, típica da Filosofia. Fragmentário e antissistemático, sentencioso no ato de lapidar uma sensação ou um pensamento e propício tanto para representar a realidade quanto para esboçar aquilo que ainda não é real, o aforismo pode alcançar o estatuto de obra em apenas em três linhas. É um estilhaço de pensamento, uma máxima espirituosa de fôlego curto e sabedoria imensa. É uma formulação arguta – ora combativa, ora contemplativa -, apta a desvelar o mundo na ligeireza de um espasmo”[2].
Por fim, Nietzsche não é um pensador que desfere golpes no vento. Suas investidas, “marretadas filosóficas”, são certeiras, quebram ídolos cristalizados nas consciências “in-conscientes”. A plaina filosófica de Nietzsche despedaça certezas, amolda, delata, desfaz, imprime formas coerentes às convicções brônzeas como se estas fossem pedaços de argila. Algumas fórmulas aforismáticas do filósofo:
(1) “Você quer ir junto? Ou ir à frente? Ou ir por si?.. É preciso saber o que se quer e que se quer”.
(2) “Esses foram degraus para mim, eu subi por eles – para isso tive que passar por eles. Mas eles pensavam que eu queria repousar em cima deles”.
(3) “A fórmula de minha felicidade: um sim, um não, uma linha reta, uma meta...”.
(4) “Não cometamos covardia em relação aos nossos atos! Não os abandonemos depois de fazê-los – é indecente o remorso”.
(5) “Da escola de guerra da vida: O que não me mata me fortalece”.
O filósofo foi um pregador incansável da afirmação da vida. Ele sabia como ninguém o valor da vida. Nietzsche é o filósofo daqueles que aprenderam a superar a si mesmos. O que afirmar de um filósofo que diz, entre outras coisas, ser “o primeiro a ter em mãos a medida para o que é a verdade?” É preciso considerar isso do ponto de vista da filosofia. Não pelo meio convencional, mas transvalorizando todos os valores; admitindo a vida.
Por Carlos Antônio M. Albuquerque
Data: 12 de abril de 2010, 21:19.
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