
Escusado é dizer que José Lins do Rego é um dos maiores escritores que já surgiram em terra brasileira. Ele é uma espécie de Marcel Proust nordestino. Um Balzac paraibano. Sabia contar uma história como ninguém; observar as idiossincrasias mais profundas do seu povo. À medida que avançava em seu texto, percebia como existe uma fluência em sua escrita. O texto corre célere como as águas de um richo. Vai embora exatificando por meio de uma transparência incomum os fatos mais caracteríticos da vida do homem nordestino.
No caso de O Moleque Ricardo, José Lins desejou dar vida a um personagem que atuou como coadjuvante nos outros três romances iniciais do "ciclo" - O menino de Engenho, Doidinho e Bangue. Ricardo atua nas três obras iniciais como aquele que brincava com o "senhozinho rico" da casa-grande - no caso, Carlos de Melo, neto de Zé Paulino, o dono do Santa Rosa. Carlos de Melo após a morte do avó não consegue manter o engenho. A bancarrota acontece de maneira certa. A morte do coronel Zé Paulino simboliza a própria morte do engenho, como se dá em Bangue.

Ricardo representa o bucolismo da cena rural. A bondade do selvagem, uma tese quase rousseauniana, contra a ganância das elites; daqueles que aviltam com a finalidade de obtenção de lucro; que alienam; que vituperam o trabalhador. Um exemplo disso se dá quando um dos empregados de seu Alexandre, dono da padaria onde Ricardo trabalha, é despedido. O patrão após perceber que o empregado havia participado de uma passeata dá as contas do sujeito. Este após ficar sem emprego, vê-se numa situação de penúria e acaba cometendo assaltos para sustentar a família. Ricardo fica sabendo da história e comenta com os amigos. A conclusão a que chegam é que o responsável por aquilo era o patrão, pois deixou o empregado numa situação vulnerável. A ganância da sociedade corrempe e sujeita o trabalhador (o bom homem) à condenação.

É como se Zé Lins inocentasse o negro Ricardo e seus companheiros da sina medonha. Foram presos e seriam deportados para um lugar distante pelo simples fato de desejarem uma vida melhor, mais digna e o resultado foi catastrófico. E o repicar dessa sentença ("Que fizeram eles?" "Não se sabe não.") vai sendo repetido como algo que se perde na distância. Uma representação do navio que transporta a leva de degredados. As metáforas são lindas. As metonímias são exatas. As aliterações mexem com a compreensão.
Baita livro!
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