quarta-feira, janeiro 21, 2015

O cinema em dezembro - 2014

 O ano de 2014 é um dado da história. Já passou. Ficou na curva do tempo. E como me prontifiquei a escrever uma crônica bamba sobre os filmes a que assisto em cada mês, infelizmente, não pude fazê-lo mês passado. Estabelecendo um balanço sobre todos os filmes vistos ano passado, o total chega a noventa e dois. Um número considerável. Não possuo números factíveis na superfície da memória. Mas, certamente, foi o ano o qual mais filmes eu vi. Passei a entender a relevância do cinema. Um bom filme nos faz ficar por dias com a sua temática presa em nossa cabeça. O poder da fotografia; a posição da câmara; a atuação dos atores; a genealidade dos bons diretores, que são capazes de transportar o espectador ao mundo imagético das telas, tudo isso gera fascínio e nos prende por horas no sofá.

Se no ano de 2014 eu vi mais filmes, no mês de dezembro eu tentei me disciplinar para ver o que pude. Vi um total de quinze filmes. Entremeei aquilo que vi com obras sérias e outras não muito sérias. Não estou com disposição para fazer resumos de cada um dos filmes. Contarei sucintamente o que de mais relevante ficou preso na teia das ideias. Começarei por aquilo que julguei "obra não sérias". Diria sem assombros que a terceira parte de O Hobbit - a batalha dos cinco exércitos me pareceu uma grande porcaria. Gosto do mundo mágico de Tolkien. Celebro sua capacidade criativa. Peter Jackson, um apaixonado pelo escritor, teve a ventura de filmar o Senhor dos Anéis e obteve um astronômico sucesso. Dirigiu-se para o O Hobbit, uma espécie de pré-história da Terra Média, e conseguiu criar um "ramerrão cinematográfico". Os dois primeiros foram até suportáveis, mas o terceiro, como diz um tio da minha esposa, ficou um verdadeiro "filme espada - longo e chato". Passei quase três horas entediado no cinema. Os adolescentes gritando em polvorosa. Batalhas insossas senso perpetradas na tela. E a certeza de que aquilo já não encanta. 

Outro filme que julgo "não sério" - e que já perdi a quantidade de vezes que já vi - foi Um príncipe em Nova York (1988), que possui toda aquela atmosfera risível dos anos 80. O filme em si não possui nada de notável. Todavia, proporciona momentos de alegria estrepitosa. O musical Chicago (2002), coloco-o entre as obras menores. Mas ele possui um background que nos transporta para a cidade de mesmo nome, celeiro do jazz, dos cassinos, dos prostíbulos, da máfia e dos sujeitos oportunistas à procura de sucesso. Não vejo muitos musicais (a não ser Jesus Cristo Superstar (1972), de Norman Jewison).

Maria Antonieta (2006) é outro filme que é um atentado à história. A diretora Sofia Coppola foi convincente com a fotografia e esqueceu de afinar os eventos dos filme aos fatos históricos. 

Resolvi voltar a ver Star Wars, filme que destila em mim aquela paixão nerd de adolescência e que me impele a repetir as falas, prever os lances, utilizar toda a feitiçaria jedi no dia a dia. Star Wars sempre me fascinou por criar um amálgama de tecnologia e tradições milenares orientais com virtudes medievais. O filme faz-nos refletir sobre o uso da moral, o conhecimento de si e os limites estabelecidos pela disciplina e o desejo de poder, que é capaz de conduzir ao "lado sombrio". Ou seja, a dimensão insaciável do poder pelo poder. Vi os três primeiros filmes - Uma nova esperança (1977), O império contra ataca (1980) e O retorno de Jedi (1984). Pretendo ver os outros três o mais rápido possível.

E a partir daqui, entramos em uma seara em que as obras vão ganhando uma maior substãncia - ou pelo menos uma feição mais underground. Nesse sentido, busquei revisitar dois filmes brasileiros: o excelente Tapete Vermelho (2005) e o visceral Amarelo Manga (2002). O primeiro é uma celebração à figura do caipira e àquele que o imortalizou no cinema - Amácio Mazzaropi. Matheus Nachtergaele consegue uma das suas melhores atuações. É uma aula de brasilidade. Uma celebração ao universo caipira - a religiosidade, a todo o espectro linguístico, à simplicidade, às lutas, à inocência etc. O segundo filme é de tirar o folêgo. Amarelo manga é, ao meu modo de ver, um dos melhores filmes brasileiros de todos os tempos. Como nos outros filmes de Cláudio Assis, há crueza, sexo, sangue; o cheiro do homem da periferia; do mangue; da linguagem saída das locas da alma, chegando ao mundo para estabelecer ou dirimir os conflito primitivo dos costumes azedos, escusos ou socialmente desbragados.

Outros três filmes que vi e que me chamaram a atenção foram Choros e Sussurros (1972), de Ingmar Bergman, que possui uma atmosfera de beleza enfermiça. Fotografia bela - talvez, uma das mais bonitas da cinematografia do século passado. Personagens acometidas pelo infortúnio. Atuações assustadoramente perfeitas. Jhonny e June (2005), uma cinebiografia, que busca retratar a carreira de artista folk de Jhonny Cash. O diretor James Mangold retrata com muita felicidade as vicissitudes desse que foi um dos maiores artistas americanos. Joaquim Phoenix atua muito bem nesse filme. Leva-me a lembrar de Os contos proibidos do Marquês de Sade (2000), filme que mostra outra atuação fantástica desse grande ator. Interestelar (2014) foi outro filme que me deixou pensando por dias. Que me levou a reler capítulos inteiros de O fim da terra e do céu, de Marcelo Gleiser. O diretor Christopher Nolan certamente consultou um corpo de cientistas ou professores competentes para escrever a obra. O labirintos criados por Nolan, como em Amnésia (2000) estão presentes mais uma vez. Tiremos toda aquela atmosfera hollywoodiana do filme e fiquemos com debate científico. Tudo o que de mais moderno tem sido debatido em matéria de ciência, Nolan busca retratar como, por exemplo, a viagem no tempo, os multiversos, a teoria das cordas, a complexidade da física quântica etc. E, talvez, a principal mensagem seja a problemática sobre a possibilidade da exaustão do planeta terra e, por conta disso, a necessidade de encontrar um outro lugar para a espécie humana. Eu com minha veia fortemente schopenhaueriana rechaço tal expectativa.

Vi ainda outros filmes como o excelente Biutiful (2010) com a boa atuação de Javier Barden. O diretor Alejandro Gonzalez Iñarritu acertou novamente. Embora, pense que seu melhor filme seja Amores Brutos (2000). Sétimo (2013), que traz o incansável Ricardon Darín é mais um bom filme argentino. Ele não possui nada de extraordinário. É um suspense, vestido por um drama. Todavia, Darín consegue tornar a coisa intrigante e dá liga até o final. Factotum (2005) é baseado no livro homônimo de Charles Bukowski. O filme cheira a banheiro sujo de rodoviária. É visceral. Derrotista. Revela a ausência de fixações geográficas, de vontades plenas, de organização vital da personagem principal. É uma mostra da geração beat a qual o próprio Bukowski esteve ligado. Ficaram ainda o iraniano Um instante de inocência (1996), de Mohsen Makhmalbaf e Histórias Proibidas (2001), do excelente diretor Todd Solondz, capaz de revelar como ninguém as misérias e contradições da sociedade americana.

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