domingo, fevereiro 26, 2017

Moonlight - sob a luz do luar (2016)

Este é o primeiro texto que escrevo este ano. Desde meados de dezembro do ano passado que mergulhei em um ritmo alucinante de atividades, o que me impediu de produzir essas reflexões mornas que em momentos frugais aparecem por aqui. Neste feriado de carnaval, os dias têm sido de relativa calmaria . Estou em casa solitário. Hoje à tarde vi Moonlight - sob a luz do luar, de Barry Jenkins e fiquei sensibilizado com a qualidade do filme. 

A obra transborda sensibilidade, seja pelas tomadas de câmara, pela atuação dos atores; seja pela história, seja pelos temas densos abordados. A obra retrata a vida de Chiron em três momentos bem distintos - a infância, a adolescência e a vida adulta. As três fases são marcadas por eventos que vão imprimindo seus efeitos na personalidade da personagem. Na infância, ele se ver acossado pelo bullyng na escola, pelo abandono da mãe viciada e prostituída e acaba encontrando a segurança da figura paterna na personagem Juan (extraordinariamente bem representado pelo ator Mahershala Ali). A personagem de Ali é um traficante, uma alternativa viável em um bairro pobre onde parece haver um determinismo para os jovens que ali vivem - ou se é viciado ou se lucra com o vício alheio. 

A segunda parte, a adolescência, aborda as dificuldades sociais do jovem. Na escola, continua sendo perseguido. Percebe-se como o vício degrada a sua mãe. É na adolescência, porém, que ele se envolve em uma relação homoafetiva com o seu colega de escola Kevin. Essa experiência se inscreve de maneira profunda em sua alma. Por conta de desavenças, ele acaba indo para a cadeia.

Na terceira parte, o filme foca na imagem do Chiron adulto, alguém que muda completamente; que parece recobrar a imagem de Juan, aquele fora uma espécie de arquétipo paternal. Chiron se torna um traficante de sucesso. Lucra com isso. Todavia, continua sendo aquele sujeito introspectivo, de poucas palavras e com o passado mal resolvido em seu interior. O abandono parental, a violência a que foi exposto, a ausência de referências, a exposição forçada ao silêncio parecem gritar, exigindo respostas, soluções. 

É nesse ponto que ele recebe uma ligação do ex-colega Kevin, que mora em outra cidade. Ao receber a ligação, as luzes difusas do passado parecem aumentar a confusão. Fica perplexo. Hesita em ir visitar o sujeito que lhe proporcionara a única experiência sexual de sua vida atribulada. Ao chegar ao destino, encontra o amigo. Após um contato inicial tímido, os dois parecem saudosos por algo. Mais tarde, Chiron confessa a Kevin que este fora a única pessoa com que havia tido uma experiência mais íntima. Os dois se abraçam e o filme acaba nesse ponto. 

Por mais que a última cena parece frouxa, ela é poderosa naquilo que diz implicitamente. Chiron sempre foi um sujeito carente de afeto. Sua vida marcada por acontecimentos desditosamente dramáticos, abriu uma lacuna de fragilidade. Apesar da vida dura do tráfico. Apesar dos músculos, da prótese de ouro para ostentar uma postura de gangster, do carro, no fundo, Chiron sempre esteve à procura de alguém que o abraçasse, que dirigisse a ele um sorriso de compreensão. Não se trata de um Boyhood (2014) ou um O Segredo de Brokeback Mountain (2005) negro, mas, da odisseia de um garoto negro que busca se tornar um indivíduo pleno em mundo habitado por desencontros. 

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