Li em janeiro "Ainda estou aqui", do escritor Marcelo Rubens Paiva. O livro inspirou o filme de Walter Salles. A leitura do livro se deu de maneira intensa, sem que pudesse desgrudar do seu texto. Escrito com forte sabor jornalístico, a história produz emoções variadas. Aos poucos, somos puxados para testemunharmos as particularidades daquela família de classe média - tão comum, tão feliz - moradora do Leblon, um dos bairros mais famosos do Rio de Janeiro. Marcelo conta a história em camadas, até o desfecho central da história, que é a prisão e o sumiço do pai; e o jogo macabro de versões contado covardemente pelos verdugos da Ditadura; bem como a transformação pela qual sua mãe precisou enfrentar para conseguir continuar após a morte do marido.
Hoje, tive a oportunidade de assisti ao filme encenado magistralmente por Fernanda Torres. Walter Salles, com uma condução impecável da história, conseguiu verter a história do livro para o cinema. Há toda uma expectativa criada - talvez - pela mídia acerca da possibilidade de o filme ganhar o Oscar de melhor filme estrangeiro. Acredito que isso não acontecerá. Não é o tipo de filme que Hollywood aplaude. Não há pirotecnias, espetacularizações, não há sangue, efeitos especiais na obra. Há, sim, a retratação da violência do Estado contra uma família. Há, sim, o luto, a dor, o medo e um tipo de "tortura" infringida à família que ficou. Eunice Paiva lutou para que a memória do seu companheiro não fosse obliterada.
Medonho é saber que até hoje pouca coisa foi feita. Nenhum dos algozes foi preso ou sofreu qualquer punição. Três deles já morreram. Medonho é saber que há pessoas no país que se esforçam para que isso volte; que salivam, que riem, que fazem vista grossa à dor dos familiares enlutados. O filme presta um triplo serviço: (1) faz uma alerta para que o país nunca mais experimente um período como aquele; (2) presta uma homenagem a Eunice Paiva, que lutou pelo resgate da memória do seu marido; (3) honra a memória de Rubens Paiva, morto covardemente pelos algozes da Ditadura.
Sei que o filme não ganhará qualquer estatueta, mas torceremos pela pela maravilhosa Fernanda Torres, que rouba a cena.
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