segunda-feira, outubro 24, 2011

Ele foi tudo o que eu quero ser - menos com as mulheres

O título parece estranho. A enunciação parece misteriosa. Intricada. Uma verdadeira charada. Explico. Penso isso todas as vezes que imagino o filósofo de Dionísio - Friedrich Nietzsche. Nietzsche foi mais que um filósofo. Foi uma águia que voou. Que ignorou as convenções religiosas e dogmáticas. Que se projetou para o céu e disse que o infinito acontece na existência de cada um de nós. Que a vida, apesar da feiúra, deve ser transformada numa obra de arte. Que é necessário inventar uma música que toque e, ao passo que toca, deve transformar nossa existência numa canção.

Nietzsche não tolerava os sentimentos fracos. As anemias do espírito. As fraquezas que aviltam. Segundo ele, era preciso caminhar, mesmo que em meio às trevas, transformando a vida num sol que ilumina. Para ele não existia nem bem nem mal. As dicotomias impedem que interpretemos corretamente a vida. Zaratustra não era criação. Era a própria voz profética (não em acepção religiosa) do filósofo falando. Falou. Criticou. Analisou sob diversos aspectos as sensaborias da sociedade em que viveu e para onde aquilo tudo conduziria. E de repente, - alguns julgam loucura - silenciou. Até mesmo a paralisia que o acometeu parece ser poética. Segundo ele, "quanto mais nos elevamos, mais pequenos pareceremos aos olhos daqueles que não sabem voar". Extraordinário. É preciso ser ousado para se alçar voos. Nem todos estão prontos ou possuem coragem para o ruflar de asas, que alcançam os céus celestiais da dúvida, do julgamento, da transvalorização dos valores. É preciso alcançar o que está "dalém do homem".

Li certa vez um artigo sobre o filósofo em que o autor dizia que a doença de Nietszche foi um castigo por ele ter se metido com Deus. Esse juízo apocalíptico (e citando Manuel Bandeira - "sifilítico", "raquítico"), não se sustenta pelos fatos. A vida do filósofo é trágica. Mas o trágico não o deteve. Como ele mesmo diz: "É preciso fecundar uma estrela bailariana de dentro do caos". E ele o fez. Sua obra atesta isso.

Agora o título "menos com as mulheres". Nieztsche não teve sucesso com as mulheres. Sua vida foi infelicitante nesse aspecto. Também nunca tive sucesso. O meu lance-acerto foi único. Mas colhi uma bela açucena, que brilha, cheira, reluz. Em tudo isso não me lamento. No mais, ignoro fatos adjacentes pelo peso da vida. Todavia, como desejo ser autêntico, ousado, destemido, amante da vida e da arte como ele foi.

Atualmente, estou lendo um livro sobre Nietzsche (SAFRANSKI, Rüdiger. Nietzsche - biografia de uma tragédia: trad. Lya Luft - Geração Editorial: São Paulo. 2001. 364p.) - embora só leia nos intervalos e, na maioria das vezes, no metrô, a caminho do trabalho. Estou impressionado com a competência do Safranki, algo que eu já havia atestado na biografia sobre Heidegger. Pretendo ler ainda outra biografia importante escrita pelo mesmo autor sobre Schopenhauer, que possui uma ligação necessária com Nietzsche. O pensamento de Nietzsche possui ecos, um verbalizar, uma tonalidade, que nos faz distinguir o autor de O Mundo como Vontade e Representação. O que de fato tem me desagradado no livro de Safranki é o forte tom analítico e filosófico. Gostaria que o biográfo dialogasse mais com a vida do bigodudo. Com Nieztsche é assim: se não entedemos a vida, não entedemos a filosofia - em todos os sentidos.

Por Carlos Antônio M. Albuquerque
Data: 24 de outubro de 2011, segunda-feira.

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