O professor chega à
sala de aula, sorridente, dá bom dia, abre o caderno de chamada e,
brincalhão, diz: “chamaaaadaaaaa... a cobrar, para aceitá-la, continue
na linha após a identificação”. Os alunos riem, um deles diz “só podia
ser o 'sor' mesmo”, o gelo é quebrado, o mestre termina o dever
burocrático e, ainda sorridente, vai começar a aula. Antes, porém, de ir
ao quadro (negro, verde ou branco), ouve de um aluno, com a aprovação
da maioria, a frase que lhe tira toda a base de sustentação: “Profe, faz
uma aula diferente hoje, pra não ficar tão chata!” O mestre diminui seu
sorriso, conta mentalmente até três e responde: “Caros alunos,
bem-vindos ao mundo real. A realidade que os espera lá fora é chata, às
vezes, assim como uma aula de língua portuguesa”.
Criou-se,
nos últimos tempos, a ideia de que o professor deve ser como um
apresentador de televisão, que precisa manter a audiência, tanto do
auditório, como dos telespectadores. É preciso conquistar os alunos,
dizem muitos teóricos no assunto, já que há outras coisas mais
interessantes fora da escola. Para tanto, se faz necessário métodos
inovadores, como a dança do “cada um no seu quadrado” ou incentivá-los a
ler Paulo Coelho. Mesmo assim, porém, não se consegue agradar aos
alunos, que querem cada vez mais liberdade e menos compromisso. Nesse
diapasão, daqui a pouco, iremos para a sala de aula, com o bolso
recheado de cédulas em forma de aviãozinho, e gritaremos “quem quer
dinheiro” para que os alunos prestem atenção nas lições. Isso se houver
lições para ensinar.
A internet
proporciona um mundo mais interessante para os nossos jovens, dizem.
Até posso concordar, afinal de contas também reservo parte do meu tempo
para pesquisas na rede mundial de computadores, e com resultados
esplêndidos. No entanto, sabemos que eles não utilizam, na maioria dos
casos, a web para aprender,
mas sim para coisas mais fúteis, como compartilhar fotos, baixar a
música do momento (geralmente de péssimo gosto), assassinar a língua
portuguesa e muitos etcéteras. Sou contra as coisas fúteis? Não, até
porque o entretenimento faz parte da nossa vida e eu mesmo já
compartilhei fotos e assassinei a língua uma porção de vezes em redes
sociais na internet (psiu, bem baixinho aqui: já fiz downloads
de músicas de gosto duvidoso também). No entanto, na idade em que mais
se deve aproveitar o tempo para aprender, os jovens desperdiçam a chance
de conhecer o que de mais importante já foi realizado pelos nossos
cientistas, filósofos, matemáticos, historiadores e escritores. E se
nós, professores, abrirmos mão disso e nivelarmos por baixo o
conhecimento, estaremos criando seres humanos medíocres, preocupados,
mas nem tanto, tão somente em atingir a média para passar de ano.
As
aulas não devem ser chatas? Por que não? Se o estudante está na escola
para aprender, uma das lições é a de que nem sempre as coisas são
prazerosas. Acordar às 6 horas da manhã para trabalhar não é nada
agradável. Pegar ônibus lotado é um saco. Nem sempre se tem um chefe
carismático. Conviver com gente chata é chato. As coisas não são,
portanto, como queremos que sejam. O mundo não gira em torno do nosso
umbigo. Essa é a realidade que nossos alunos vão enfrentar. E é isso,
também, que devemos ensinar.
Texto publicado com a autorização do senhor Cassionei
3 comentários:
Obrigado por repercutir meu texto. Abraço.
Cassionei, acho esse seu texto simplesmente formidável. Ele toca em uma problemática que é comum a todos os professores - ensinar a uma geração que desaprendeu a tomar sustos; que desaprendeu o encantamento do mundo. Utilizei-o em uma prova!
Obrigado pela visita.
Abraços!
Obrigado. Abraço.
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