quinta-feira, maio 27, 2010

Powaqqatsi, a vida enfeitiçada

Tomei conhecimento da trilogia Qatsi (Koyaanisqatsi, Powaqqatsi e Naqoyqatsi) numa aula de sociologia da educação. O professor explicava o que significava micro-sociologias. Para ilustrar a explicação que dava, resolveu mostrar para os alunos cenas do primeiro filme da série Qatsi, Koyaanisqatsi. Quando vi as imagens mescladas, coladas àquela música arrebatadora, senti um frêmito diferente. Fiquei extasiado. Um silêncio admirativo se apoderou de mim. Pura estupefação. Daquele momento em diante resolvi que deveria ter aquela obra enfeitiçada, repleta de poderes mágicos.

Empreendi uma busca. Procurei em vários sites da internet. Até que achei. Mas infelizmente o achado estava incompleto. Somente os dois primeiro estavam disponíveis, a saber, Koyaanisqatsi e Powaqqatsi. Comprei-os sem qualquer titubeio. Assisti por diversas vezes ao primeiro. Passados três anos, somente agora me dediquei a ver o segundo, filmado no ano de 1988. A experiência foi positiva. Não chegou a me impressionar tanto quanto primeiro, mas fiquei com aquela impressão aural, de magicidade, após ver ao filme. Falta-me apenas assistir ao terceiro – Naqoyqatsi – que consegui no final de 2009.

O interessante na temática de Powaqqatsi é o objeto de análise. Godfrey Reggio, o diretor da obra, colocou em foco o Hemisfério Sul. Enquanto o primeiro filme, Koyanisqatsi, focou o Hemisfério Norte dito “civilizado” e o seu modo de vida contradizente, o segundo buscou realçar como está organizado o chamado terceiro mundo. Assim, o filme mostra com bastante realismo como o mundo subdesenvolvido, formado por culturas orais, que produzem instrumentos manuais herdados por transmissões ancestrais, está estruturado. Como a desigualdade avassaladora é resultado de uma causa.

O vocábulo Powaqqatsi é uma junção de termos do idioma Hopi. A tradução aportuguesada ficaria assim: powaqq – “feiticeiro”, “bruxo”; qatsi – “vida”. No ajuste dos termos, fica assim: “uma espécie de entidade que se utiliza de um modo de viver para prolongar sua própria vida”. Powaqqatsi é um filme que trata de “sedução”. Ou seja, de um modo de vida que tem sofrido os efeitos mais violentos do progresso. A obra mostra como essas “culturas sulinas”, têm sido “parasitadas” por um estilo de vida ludibriador. A sedução não se dá com força, com violência, não usa imperativos belicistas. O estilo de vida criado por culturas “civilizadas” é o próprio “bruxo” capaz de tornar os indivíduos em seus escravos. Segundo o próprio Reggio, “o hemisfério sul está sendo consumido pela ordem criada pelo hemisfério norte”.

Os homens criaram uma utopia e essa utopia é a imortalidade virtual. Até então, esses poderes eram somente atribuídos às divindades. Os poderes de conservação e transmissão da imortalidade pertenciam somente aos deuses tidos por soberanos e eternos. Agora, outros deuses foram criados. Um novo panteão de seres e objetos magicizados. O computador está no centro de tudo. Todas as teias comunicativas que geram encantamento se ligam a ele. Os homens para se enxergarem, para se encontrarem, para se medirem, para serem saciados em suas necessidades espirituais vão à teia invisível da virtualidade. O computador tornou-se assim numa espécie de oráculo, o instrumento mais poderoso do mundo. O computador potencializa a criação de avatares, de transfiguração dos desejos e dos seres que se ligam a esses próprios desejos. Nesse sentido, é a maior mágica do mundo. É algo pelo qual todos têm adoração.

Assim, como em Koyaanisqatsi, Powaqqatsi tem a trilha sonora composta por Philip Glass, mestre do minimalismo musical. Sua música produz efeitos impressionantes enquanto vemos às imagens. É impossível “desvencilhar” a sucessão das imagens com a música. A música está encaixada às imagens e, as imagens, à música. O filme é uma forte experiência espiritual e de despertar da consciência.

Amostra de um dos capítulos do filme:



Por Carlos Antônio M. Albuquerque
Data: Quinta-feira, 27 de maio de 2010, 19:28:17

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