quinta-feira, junho 03, 2010

Consolo na Praia, por Carlos Drummond de Andrade

Ah! Drummond, como você é exato, preciso, absurdamente frio, com técnica de perito para narrar a linguagem da alma. Suas palavras são como uma lamparina a iluminar a nudez do coração achacado pelas pisaduras da vida. Existir é um fenômeno repleto de reveses. Na travessia, choro e lágrimas serão a matéria que molharão os passos na caminhada. Enquanto existir fôlego, existirá vida; enquanto existir vida, haverá perspectivas, alento, possibilidades. Quando a vida cessa, extingue-se a possibilidade de realizações, do preenchimento existencial. Enquanto os olhos não fecharem, enquanto a noite plena não se fizer, vivamos.

Consolo na praia

Vamos, não chores..
A infância está perdida.
A mocidade está perdida.
Mas a vida não se perdeu.
O primeiro amor passou.
O segundo amor passou.
O terceiro amor passou.
Mas o coração continua.
Perdeste o melhor amigo.
Não tentaste qualquer viagem.
Não possuis casa, navio, terra.
Mas tens um cão.
Algumas palavras duras,
em voz mansa, te golpearam.
Nunca, nunca cicatrizam.
Mas, e o humour?
A injustiça não se resolve.
À sombra do mundo errado
murmuraste um protesto tímido.
Mas virão outros.

Tudo somado, devias
precipitar-te, de vez, nas águas.
Estás nu na areia, no vento...
Dorme, meu filho.

Carlos Drummond de Andrade

Análise do poema AQUI

Por Carlos Antônio M. Albuquerque
Data: 03 de junho de 2010, 09:44:51

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