quarta-feira, janeiro 22, 2014

"Crimes e Pecados", de Woody Allen - um tratado sobre o comportamento humano

Vi ontem, com um olho aberto e outro e outro fechado, em decorrência do sono, o ótimo filme Crimes e Pecados, de Woody Allen. Assisti a esse filme sempre foi uma luta (risos!). Iniciei várias vezes e nunca terminei. Desejei, da última vez, iniciar e finalizar. O filme é imensamente agradável. Está dentro do gênero comédia, mas, ao fim, percebemos que se trata de uma tragicomédia, com forte sabor filosófico.

Crimes e Pecados constrói uma tese cristã sobre os homens: todos os homens são culpados; todos os homens cometem crimes morais e, por isso, são pecadores. Os personagens centrais possuem máculas em sua personalidade ou cometem delitos privados, omitidos na vida pública. O oftalmologista bem-sucedido, dono de uma aparente reputação ilibada; pai de família exemplar; segue um fluxo amplo nas relações sociais, mas acoberta um adultério. E quando a amante ameaça trazer o romance proibido à tona, ele decide matá-la. Depois, se ver acometido pelo remorso e pela culpa, já que descendia de forte educação judaica. E segundo seu pai, "Deus retribuirá com um prêmio ao homem bom e com o castigo o homem mal". 
Judah Rosenthal (Martin Landau) e Dolores Paley (Anjelica Huston
 Halley Reed (Mia Farrow), que aparenta ser um oceano de recato moral, acaba casando com Lester (Alan Alda), simplesmente, por interesse. Cliff Stern (Woody Allen), apesar de parecer um sujeito aparvalhado, por certo momento, decide trair a esposa com a companheira de profissão, Halley Reed. Queria levar à frente o romance, mas se ver impedido pela deferência da moça. Até mesmo a esposa de Cliff, nas cenas finais do filme, diz ao irmão Lester que havia conhecido uma pessoa. Ou seja, a consumação de mais um adultério. Claro, as minhas descrições ficam apenas no campo do imediatismo, sem esboçar contundentemente a gama complexa trabalhada no filme.

Cliff Stern (Woody Allen) e Halley Reed (Mia Farrow)
Frase lapidar é enunciada pelo personagem de Woody Allen: "Nós somos a soma de nossas decisões". Entendo que essa frase possua metade do devir pela qual somos acometidos. Ela é verdadeira. Mas entendo que não são apenas as nossas decisões que fazem cada um de nós. Somos resultado de conjunturas sociais, culturais etc. Mas, por sua vez, o que Cliff quer dizer é que muitas das decisões que tomamos acabam por trazer consequências e que nos colocam em caminhos que definem a nossa existência. Escolher uma estrada é optar, também, não caminhar por outra estrada. E os fatos e relações que estão presentes na estrada que decidi caminhar, criam ramificações que vão trazendo consequências e se instauram como fios tentaculares. Tais eventos acabam gerando fatos que estão para além do nosso controle, como acontece, por exemplo, com o oftalmologista a qual citei acima.

Nossas decisões encerram premissas morais. A tese do filme é pessimista em excesso - e porque não dizer niilista? Ou seja, todos os homens são corruptos ou passíveis de corrupção. Isso me faz lembrar uma passagem bíblica: "O homem pode prevaricar até por um pedaço de pão" (Pv 28.21). Uma das definições para "prevaricar", segundo o Aurélio, é "torcer a justiça", "faltar ao dever", dando a entender que se trata de algo que encerra um elemento moral. Nesse sentido, Crimes e Pecados confirma essa afirmação reputada a Salomão.

Excelente filme! Vale a recomendação.

O filme pode ser visto no Youtube.

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