
Não pretendo recontar todos os detalhes da história, mas especular sobre alguns pontos relevantes observados por mim. A história se passa no antigo Engenho Santa Rosa do coronel José Paulino, com a volta de Ricardo ao engenho de onde saíra no quarto romance do Ciclo ("O moleque Ricardo"). Dessa vez, o engenho sai de cena e entra a usina Bom Jesus do Dr. Juca, filho do ex-senhor de engenho José Paulino. Juca monta a usina graças à cooperação dos parentes que ajudam com o capital para financiar o empreendimento. Nos primeiros anos, a Bom Jesus não conhece dificuldades. O tino administrativo e o entusiasmo de Juca torna o negócio rentável. O açucar é vendido a um preço alto - 60 contos a saca. Mais tarde, no tempo de dificuldades, cai para um terço do valor.
Tal sucesso permite ao Dr. Juca viver como um dândi em Pernambuco e na Paraíba. Ignora a prudência; ignora a esposa - Dona Dondom; ignora os filhos. Financia a vida das amantes. Compra carros caríssimos. Esbanja. A derrocada da Bom Jesus se deu quando Juca tenta reformar, tecnologizando-a, colocando-a na esteira do tempo. Assume, assim, um grande número de dívidas, que somado ao baixo preço do açucar, faz com que tudo vá por água abaixo.

Diferente dos demais livros, Usina não foca em um personagem como se dá com os três primeiros livros, que centra sua atenção em Carlos de Melo; e o quarto, que torna o centro da narrativa, o personagem Ricardo como operário no Recife. Usina possui vários focos narrativos, todos alinhavados por uma ideia de grandeza. Todas as personagens estão ligadas pelo poder conferido pelo dinheiro. A propriedade se torna no romance a única coisa que se projeta. E a ganância que alimenta os sonhos dos poderosos, em contraposição à bondade dos simples, personificado por dona Dondom e pelo povo humildade.
A propriedade e ânsia pelo ganho se tornam o desejo daqueles que possuem o capital. Já aqueles que não possuem os meios de produção são "amansados" pela superstição religiosa e pela impotência conferida pela miséria. Usina nos põe diante da decadência da ideia de patriarcado oligárquico, na qual a força que sustentava essa estrutura social é solapada no simbolismo da derrocada da Bom Jesus. Curiosa é a ideia de "dilúvio" no final da obra. Não sei qual era a finalidade - talvez isso desse matéria para uma boa discussão - de José Lins ao terminar o Ciclo com uma enchente do Rio Paraíba. Não há como negar que Zé Lins estabelece uma relação com o Guarani, de José de Alencar, e a enchente que funciona neste livro como um mito de fundação da população brasileira. Em Usina, ao contrário, o dilúvio do rio Paraíba funciona como um agente causador de ruína, fomentando inevitavelmente um processo dialético, a mudança que dá início a um novo tempo.

Poucos escritores possuem essa capacidade. Ainda tenho 5 romances do escritor paraibano em minha biblioteca para serem lidos - Pureza, Pedra Bonita, Fogo Morto, Eurídice e Cangaceiros. Sigamos!
Nenhum comentário:
Postar um comentário