quarta-feira, janeiro 23, 2013

Reflexões sobre a sociedade do espetáculo


"A servidão moderna é uma escravidão voluntária, consentida pela multidão de escravos que se arrastam pela face da terra. Eles mesmos compram as mercadorias que os escravizam cada vez mais. Eles mesmos procuram um trabalho cada vez mais alienante que se lhes outorga se demonstram estar suficientemente domados. Eles mesmos escolhem os mestres a quem deverão servir".


"Neste estreito e escuro espaço onde vive, o escravo acumula as mercadorias, que, segundo as mensagens publicitárias onipresentes, deverão lhe trazer a felicidade e a plenitude. Mas quanto mais acumula mercadorias, mais se afasta dele, a possibilidade de ter acesso, um dia, à felicidade".

"A mercadoria, ideológica na essência, priva do seu trabalho quem a produz, e despoja de sua vida, que a consome".

"Todas estas mercadorias, destruídas massivamente num curto lapso de tempo, modifica profundamente as relações humanas. Se serve por um lado para isolar o homem um pouco mais dos seu semelhantes, por outro para difundir as mensagens dominantes do sistema. As coisas que possuímos, acabam nos possuindo".

A pilhagem dos recursos do planeta. A Abundante produção de energia ou de mercadorias. Os resíduos e os despejos do consumo ostentoso hipotecam as possibilidades de sobrevivência da nossa terra e das espécies que a povoam. Mas para dar passagem ao capitalismo selvagem, o crescimento não deverá parar jamais. Há que se produzir, produzir e voltar a produzir cada vez mais".

"Para entrar na ciranda do consumo frenético, tem que ter dinheiro. E para tê-lo, tem que trabalhar. Quer dizer, "vender-se". O sistema dominante fez do trabalho seu principal valor. E os escravos devem trabalhar
cada vez mais para pagar a crédito sua vida miserável".

"Se esgotam no trabalho, perdem com ele a maior parte de sua força vital e tem que suportar as piores humilhações. Passam toda sua vida fazendo uma atividade extenuante e monótona para benefício de poucos.  A tensão do desemprego moderno tem como propósito assustá-los e fazê-los agradecer sem parar à generosidade do poder. Que fariam sem essa tortura, que é o trabalho? São estas atividades alienantes, as que nos apresentam como um liberação. Que mesquinhez e que desprezo. Sempre pressionados pelo cronômetro ou pela campainha, cada gesto dos escravos está calculado para aumentar a produtividade. A organização científica do trabalho constitui a essência da disposição dos trabalhadores. Do fruto de seu trabalho, e do tempo que passam na produção automática das mercadorias e dos serviços. A atividade do trabalhador confunde-se com a de uma máquina nas fábricas, ou com de um computador nos escritórios. O tempo pago não se recupera jamais. Desta maneira cada empregado está ligado a um trabalho repetitivo, seja intelectual ou físico. É um especialista em sua área de produção. Esta especialização se reproduz em escala planetária no marco da divisão internacional do trabalho. Se concebe no ocidente, se produz na Ásia, e se morre na África".

À medida que o sistema de produção coloniza todos os setores da vida, o escravo moderno, não satisfeito
com sua servidão no trabalho, segue desperdiçando seu tempo nas atividades de dispersão e férias planejadas. Nenhum momento de sua vida escapa da influência do sistema. Cada instante de sua vida foi invadido. É um escravo do tempo completo".

"O melhor de sua vida escorre pelos seus dedos, mas ele continua porque tem o costume de obedecer sempre. A obediência se converteu na sua segunda natureza. Obedece sem saber porquê, simplesmente porque sabe que deve obedecer. Obedecer, produzir e consumir. Aí está a tríade que domina a sua vida. Obedece a seus pais, seus professores, seus patrões, seus proprietários e seus negociantes. Obedece a lei e as forças de ordem. Obedece todos os poderes, porque não sabe fazer outra coisa. Não há nada que o assuste mais que a desobediência. Porque a desobediência é o risco, a aventura, a mudança. Assim como uma criança que entra em pânico quando perde de vista seus pais, o escravo moderno sente-se desorientado sem o poder que o criou.".

"O escravo moderno está convencido de que não existe alternativa para a organização do mundo presente. Se resignou a esta vida porque pensa que não pode haver outra. É aí onde reside a força da dominação presente. Fazer crer que este sistema, que colonizou toda a superfície da Terra, é o final da história. Convenceu a classe dominada que adaptar-se à sua ideologia equivale a adaptar-se ao mundo tal como é e tal como sempre foi. Sonhar com outro mundo converteu-se num crime condenando unissonamente pela mídia e por todos os poderes". 

Frente à devastação do mundo real, é necessário para o sistema colonizar a consciência dos escravos. É por isso que o sistema dominante decidiu se focar na dissuasão que desde a idade mais nova, cumpre o papel
preponderante na formação dos escravos. Eles devem esquecer sua condição servil, sua pressão e sua vida miserável. Basta conter essa multidão hipnótica conectadas as telas que acompanham sua vida cotidiana. Eles disfarçam sua insatisfação permanente com o reflexo manipulado de uma vida sonhada, cheia de dinheiro, de glória e de aventura". 

"Há imagens para tudo e para todos. Essas imagens levam em si a mensagem ideológica da sociedade moderna e servem de instrumento de unificação e de propaganda. Multiplicam-se à medida que o homem é
tirado de seu mundo e de sua vida".

"Há imagens para todas as idades e para todas as classes sociais. Os escravos modernos confundem essas imagens com a cultura e, às vezes, com a arte". 

"A imagem segue sendo a forma de comunicação mais direta e mais eficaz. Constrói modelos, embrutece as massas, mente, cria frustrações e infunde a ideologia mercantil. Trata-se, pois, uma vez mais e como sempre
do mesmo objetivo: vender, modelos de vida ou produtos, comportamentos ou mercadorias". 

"Enquanto os imperadores da Roma Antiga compravam a submissão do povo com pão e circo, atualmente é com diversões e um consumo cego com que se compra o silêncio dos escravos".

"O sistema dominante se define então pela onipresença de sua ideologia mercantil. Ocupa de vez todos os espaços e todos os setores da vida. Não declaram mais do que a necessidade de produzir, vender, consumir, acumular. Reduziu todas as relações humanas a medíocres relações mercantis. E considera que nosso planeta é uma simples mercadoria".

Do documentário francês A Servidão Voluntária, de 2009. 

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