domingo, dezembro 07, 2014

O exercício inquieto...

"O cronista é um escritor crônico". Affonso Romano Sant'Anna

Este espaço tem estado entre o abandono completo e o relapso do seu postador oficial. Não gostaria que fosse assim. A indisciplina me priva completamente de aparecer mais vezes. Não é falta de motivos, nem de ideias. Talvez seja a quantidade de trabalho e exigências. Todavia, se há foco, esse obstáculo também é contornado. Na próxima semana entrarei de férias. Por isso, penso em comparecer de forma mais recorrente por aqui. Há ainda uma expectativa de estudos. Vou me auto-exilar em uma biblioteca pública todas as manhãs no meu período de recesso.

Pretendo retornar aos textos magros, ao olhar míope, crivado de clichês e a emitir opiniões sobre as notas que escuto com uma audição deficiente. Não escrevo para que haja leitores. Intenção não tenho de que este espaço se torne um recanto de curiosos. Até me falta a suficiente musculatura intelectual para empreender grandes maratonas literárias. A irregularidade das leituras me aborrece. Meus muitos livros comprados em 2014 são uma efígie em minha consciência. Estão prestes a me devorar por completo. Não restará um tecido sequer. Impaciento-me.

Mas a literatura é um labirinto. É como naquele conto do Cortazar - A continuidade dos parques. Eu leio o autor que me lê através do seu personagem. Ela é uma porta dimensional que conecta o real e a representação do real, suscitada pela narrativa.  Há pouco estava lendo o livro O homem desenraizado de Todorov e tropecei nessa pequena parte do livro. Estou até agora pensando sobre o que li. O autor franco-búlgaro faz um pequeno resumo de um conto de Maupassant, chamado de A joia. A literatura é a construtora e a destruidora de mundos. E é essa emersão que realizamos em espaços como este, todas as vezes que lemos um livro que possui uma força verrumadora. Olha o que diz Todorov:

"Uma jovem mulher de origem modesta pede emprestado a uma conhecida rica um colar de diamantes para usá-Io no baile; por infelicidade, o colar é roubado. A mulher toma como questão de honra devolver a joia: pede emprestada uma soma enorme e compra um colar idêntico. O resto da vida transtornou-se: ela passa os anos seguintes a reembolsar a dívida contraída. Anos mais tarde, quando sua vida já está em declínio, ela reencontra a antiga benfeitora e lhe relata fielmente o incidente. "Minha pobre amiga", exclama a outra, "os diamantes eram falsos, o colar não valia nada." (Todorov, Tzvetan. O homem desenraizado. Editora Record, 1999, p. 73)

Isso é atordoante!


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