segunda-feira, maio 11, 2020

"Amor à tarde", de Eric Rohmer - algumas considerações

Vi há uma semana Amor à tarde (1972), de Eric Rohmer. É o último daquilo que ficou conhecido como os seis contos morais. São obras dirigidas por Rohmer, que traziam consigo densos e complexos problemas morais e éticos.
 
Trata-se de uma produção sofisticada, de diálogos e monólogos elegantes; da presença de cafés que servem para imprimir aquela atmosfera existencialista francesa tão típica. Na verdade, Amor à tarde é um filme simples do ponto de vista da fotografia. É a história de um burocrata chamado Fréderic, casado com Hélene. Ambos se encontram em momentos escassos. Estão casados há pouco mais de três anos. Possuem filhos. Hélene trabalha durante o dia como professora. À noite, gasta o tempo entre as atividades domésticas e a correção dos trabalhos escolares. 

Fréderic é um burguês típico. Possui uma vida sólida, pouca dada a eventos extraordinários. Sai de casa. Vai para o escritório. Recebe mensagens das secretárias. Conversa com os sócios. Sai para almoçar em certos horários. Mas, é justamente nesse ponto que começam a surgir os monólogos da personagem. O devotado Fréderic seria capaz de trair Hélene? Ele olha as mulheres com as quais cruza pela rua ou encontra no café. Observa-as. Imagina situações insólitas. Deseja todas elas. Mas, no seu entendimento, Hélene consegue reunir as qualidades de todas as mulheres.
 
Chloé e Fréderic 
 
Até que uma amiga antiga, certo dia, ressurge em sua vida. Seu nome é Chloé. Sua vida de liberdade é algo que intriga Fréderic. Ela mora em um apartamento com um parceiro eventual. É livre em demasia. Aos poucos, o personagem se encontra enredado pelo seu jeito leve, solto, desimpedido. E neste ponto encontramos um dos aspectos mais salutares desta obra de Rohmer: ao contrário de outros filmes que tratam de adultério, o diretor não entrega nada de graça. Os eventos não se materializam com tanta rapidez e empacotamento. O que chama a atenção é elemento existencial, das intenções, das insinuações. O adultério não é apenas uma satisfação física. Ele é a consumação de uma violação moral.
 
Pé ante pé, observando Chloé e Fréderic,  somos conduzidos à compreensão de que a consumação do ato sexual é algo iminente. Os dois parecem aceitar o relacionamento. Chloé parece flertar com o exotismo de Fréderic. Ele, na compreensão dela, está preso moralmente a convenções comezinhas. 

Ele, por sua vez, sente-se bem com isso. Parece aceitar o jogo do homem casado que comete uma traição contra a sua companheira. Não quero antecipar nada (caso alguém tenha interesse em ver o filme ou tenha chegado aqui procurando informações sobre ele), mas os momentos finais deixam o espectador embasbacado. A pergunta que fica é: o que você faria caso estivesse no lugar de Fréderic?


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