quinta-feira, março 14, 2013

O Brasil e uma explicação para aquilo que se é

O blog está à míngua. O tempo anda escasso. Tenho trabalhado em excesso, o que tem, consequentemente, impedido-me de escrever. As ideias estão presentes, mas as oportunidades são raras para que elas se materializem. As leituras estão emperradas. Já estou há mais de um mês com O Idiota, de Dostoiévsky, estacionado. Mas, há alguns dias atrás, lendo sobre os conceitos de Lacan e a educação, encontrei uma afirmação interessante sobre Contardo Calligaris, um psicanalista europeu que estudou a sociedade brasileira. O trecho me pareceu bastante esclarecedor:

"Contardo Calligaris (1992), uma renomado psicanalista lacaniano europeu, porém com bastante vivência da cultura brasileira, faz uma leitura interessante das nosssas fundações e dos seus reflexos na nossa subjetividade. Ele busca na história da nossa cultura, nas nosssas herenças mais longínquas, elementos capazes de escalarecer alguns de nossos hábitos e costumes, particularmente relacionados ao tratamento que damos às crianças e como concebemos a infância e a educação.

Segundo ele, a ocupação do Brasil pelos europeus se deu pela miragem subjetiva dos invasores de encontro ao paraíso, um lugar de riquezas, de gozo fácil e de felicidade absoluta. Tal miragem corresponderia à visada infantil de acesso pleno e irrestrito ao corpo materno: fonte de todos os prazeres, da satisfação de todos os desejos. A ausência de uma resistência significativa às miragens ensandecidas dos exploradores teria esmaecido a noção de lei, um interdito que pudesse colocar algum freio na sanha dos conquistadores, tal como a palavra do pai coloca limites para a criança.

Assim, a nossa herança cultural, nossas fundações, seria marcada principalmente por esse sonho primevo de felicidade e gozo sem limites que teria atravessado o tempo e estaria presente ainda hoje, direcionando nossa subjetividade.

Com efeito, reconhecemos facilmente entre nós o 'jeitinho brasileiro', expressão direta do esmaecimento da lei ou da disposição para burlá-la e transgredi-la, como se estivéssemos reencenando a chegada dos primeiros exploradores ávidos para usufruir a posse da terra e exauri-la, sem nenhuma restrição ou sendo de responsabilidade". 

Creio que essa leitura sob um viés lacaniano explique muita coisa sobre o nosso país tão propenso a burlar, a esmaecer os códigos reguladores da vida social. Está na psicologia de nossa formação. 

Introdução à psicologia da educação - seis abordagens. Kester Carrara (org.), in: A psicanálise lacaniana e a educação. Avercamp. 2004, p. 90

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