sexta-feira, julho 26, 2013

Livros - mais livros... II

Parece ser um evento novelístico ou quem sabe a atestação do mito de sísifo; ou ainda uma ciranda louca e contumaz de um rio que deságua no mesmo oceano infindo de prazer marginal. A promessa não cumprida. O desafio feito como evento para apaziguar o fetiche brutal que habita as listas e as linhas da agenda. O rabiscar. O "ok" que é dado diligentemente quando o objeto é conquistado como a liberdade desejada pelo cativo. A sensação de meta realizada. De mais um plano alcançado. De mais um exercício consumado.

Fiz uma promessa no início da semana, mas ela não se sustentou por muito tempo. Simplesmente, vacilei em minha pusilanimidade de vontade, em minha indisciplina. A sensação de culpa. A consciência cônscia do desatino.

Afirmo tais coisas, pois hoje fui à Livraria Cultura aqui em Brasília. Saí do trabalho às quatro da tarde e fui com a minha esposa àquela loja capaz de criar mitologias. De fazer escancarar uma planície de ânsias indomáveis. Fizera a promessa de que não iria a espaços onde houvesse livrarias. Minha esposa procurava algum tipo de literatura que fosse ou que tratasse do filósofo Antonio Gramsci. Inconscientemente, eu sabia da potencialização do pecado. Mas fui. Acabei sendo fisgado, inevitavelmente, pela disposição da necessidade. Voltei da loja com cinco livros. Eis as materializações dos meus pecados: 

Tratava-se de um projeto de compra antigo. Ganhou corpo depois que li o texto que pode ser encontrado aqui. O livro, conforme se pode ler na nota explicativa, foi publicado em 1859. É o livro que marcou a volta de Dostoiésvki ao mundo da literatura após quase dez anos de exílio na Sibéria. Obra da Editora 34 e traduzido por Lucas Simone, direto do russo.
 O outro livro que, na verdade, é um conto, foi escrito em 1873. É um texto que surge com o espírito sardônico, por exemplo, como O alienista, de Machado de Assis, criando cintilações ácidas em torno dos costumes aristocráticos viciosos da Rússia do final do século XIX. Outro livro da magistral Editora 34 com tradução de Paulo Bezerra.











Já o livro O duplo eu conheci quando fazia o curso de Letras. Não cheguei a lê-lo. Apenas li referências à obra. É a segunda obra escrita pelo russo. No ano de 1846, Dostoiévski publicou Gente Pobre e, duas semanas depois, soltaria O Duplo. A obra vai revelar ao mundo a viagem dostoievskiana ao abismo escuro e caótico da consciência humana. Nesta obra está o gérmen para os personagens complexos e multifacetados como Raskolnikov ou o príncipe Michkin. Essa abordagem acontece com aquela mestria típica do russo, que sempre mergulha nas profundezas da alma humana, com finalidades perscrutatórias. Novamente, a excelente Editora 34 e tradução de Paulo Bezerra.
 O primeiro livro do escritor norueguês, Karl Ove Knausgärd, a aparecer por aqui - Minha Luta 1 - A morte do Pai - eu conheci pelo blog do Charlles. Ao entrar na Livraria Cultura, pude ver na sessão de lançamentos o livro de Knausgärd e, imediatamente, fui fisgado. A começar pela capa que traz uma bela e evocativa paisagem de uma estepe. As estepes sempre foram uma espécie de porta dimensional que me leva a mundos inóspitos e carregados de mistério. Leio a seguinte informação na orelha do livro: "No presente da narrativa, com 39 anos e três filhos, Knausgärd deve se ajustar à rotina da família, trocar fraldas e apartar brigas, tudo isso enquanto tenta escrever seu novo romance, numa luta diária. É esse homem que busca se haver com a morte do pai e com o próprio passado, lançando-se em uma investigação minuciosa que resulta nesta obra aliciante híbrido de ficção e memória. Não é à toa, entre variadas referências literárias a Proust aparece como a inspiração mais evidente de seu ousado projeto, que se estende por mais de 3 mil páginas e seis volumes, sem abandonar a matéria autobiográfica".

 A temática desse livro eu vi na entrevista que Mário Vargas-Llosa, um dos mais eminentes escritores latino-americanos da atualidade, deu ao programa Roda Viva no mês de maio. Llosa é um liberal franco, profundo e de fala fácil. É bom ouvi-lo. Em A civilização do espetáculo (uma evocação do livro homônimo de Guy Debord?), o ganhador do Prêmio Nobel de Literatura do ano de 2010, desfere golpes contra "a banalização das artes e da literatura". Trata-se de um livro que se coloca no campo da crítica cultural. O escritor peruano entende, neste livro, que a cultura não deve se esquivar da realidade, gerando inclinações unicamente para a diversão e o entretenimento. O livro gerou algumas críticas a Vargas-Llosa como, por exemplo, a de que ele faz a defesa de uma cultura "eurocêntrica". Penso em minha simplicidade que a sua crítica seja contundente e séria.

2 comentários:

Cassionei Petry disse...

Só pra constar que continuo sempre lendo teus blogs. Abraço.

Carlinus disse...

Obrigado, Cassioney, ainda mais vindo de um leitor e escritor experimentado como você. Também leio os seus posts - sempre de bom gosto e sensibilidade literária. Infelizmente ou felizmente existe um silêncio da parte de cá. Aquilo que escrevo surge como um exercício para mim mesmo. É uma forma de aprender e apreender aquilo que leio. Isso vai me construindo, me moldando. Tudo pela paixão vinda dos livros. Hoje, existe uma quantidade de blogs e experimentos positivos voltados para o debate em torno da literatura. Isso é bom para troca de experiências. Muitos desses debates e comentários não perdem em nada para aquilo que é escrito em revistas de literatura. Por exemplo, aprendo muito com o seu blog, com o do Milton ou do Charlles, entre outros sítios. Abraços, Cassioney!