quinta-feira, dezembro 15, 2011

Jorge Luis Borges e o labirinto da literatura

A literatura é um caminho de possibilidades infinitas. É uma planície que desemboca no mistério sem fim. O livro de Eclesiastes, filho da sabedoria judaica, diz que "não há limites para se escrever livros". O Google estima que existam mais de 3 trilhões de livros em todo mundo. Uma quantidade quase impensável, absurda. Se colocados lado a lado daria para dar voltas e voltas em torno do mundo. As possibilidades desses livros nos inclinam a mentalizar imaginações surreais, próximas daqueles quadros pintados por Salvador Dali.

E Borges, para nos aturdir, escreveu um conto chamado "Biblioteca de Babel" na qual imagina um universo constituído por livros. Ou seja, uma biblioteca do tamanho do universo, com prateleiras que se sucederiam umas as outras. Ao imaginarmos algo assim, bate-nos o senso de completo o entedimento de algo que fere as regras da lógica. O escritor argentino, na verdade, quis apenas construir uma metáfora, uma espécie de brincadeira com as possibilidades infinitas do texto ou com a possibilidade de criar; ou ainda uma metalinguagem com conhecimentos acumulados pela humanidade até os dias de hoje. O que nos assusta perante este fato é o noção de pequenez diante de estruturas invisíveis. O conhecimento que podemos apreender é finito. E as areias do tempo escorrem de maneira quase que infinitas em nossa percepção finita. Não poderemos ler todos os livros do mundo. Há uma limitação. O bibliófilo José Mindlin morto no ano de 2010, afirmou ter lido em toda a sua vida, algo em tono dos 8 mil títulos. Incrível. Pensando nisso, inquita-nos saber que as bibliotecas estão repletas de trilhas infinitas.

Mas o fato é que Borges é um escritor instigante. Seu texto é uma costura com outros textos falando do seu próprio texto - ou de outros textos. Terminei de ler O Livro de Areia, escrito em 1975. E torna-se curioso como ele brinca com a possibilidade do duplo. Seu texto é uma rede labiríntica, no qual nos perdemos em sensações e em tentativas de definições, de conclusões. Cada conto do livro é um quadro com linhas infinitas que constroem um tecido infinito. A erudição de Borges beira o absurdo. Seu estilo parece incorporar - fica-nos a sensação de paradoxo - de que ele abarcou quase que todos os conhecimentos possíveis. Suas citações, referências, construção de personagem são um passeio pela história - e as areias escorrem numa espécie de ampulheta invisível. Os personagens fictícios possuem uma verossimilhança absurdo com o real como no conto Avelino Arredondo, um dos mais instigantes do livro.

Fiquei pensando no arranjo do livro. O primeiro conto é O outro, conto este que tem sido alvo de teses e artigos acadêmicos. Borges brinca com o leitor. Existe um duplo aturde. Ao final, saímos da experiência nos perguntando: "terá isso sido verdade? É Fantástico!" Mas, o último conto do livro chama-se O Livro de Areia. Neste conto, logo no início achamos a afirmação: "A linha consta de um número infinito de pontos; o plano, de um número infinito de linhas; o volume, de um número infinito de linhas; o volume, de um número infinito de planos; o hipervolume, de um número infinito de volumes...."

Borges parece escrever uma metalinguagem de sua própria obra, uma espécie de autotexto. Ou em outra abordagem, o escritor argentino parece construir uma metáfora do próprio caráter instável da literatura, pois não sabemos de onde vem esse livro de areia. Essa imagem apenas realça a ideia de labirintos infinitos nos quais nos perdemos neles. Os caminhos nunca são planos ou retos em Borges. Eles sempre nos conduzem para encruzilhadas, para planos justapostos. O espaço da ficção e da realidade é separado por uma película fina, tênue, quase transparente.

Procurarei outro livro de Borges - Ficções - para ler. Por enquanto, ficarei com aquelas cenas pintadas com um realismo mágico; uma ficção poderosa que nos insere num plano de imagens densamente fortes. Em Borges, não sabemos se estamos conhecendo personagens fictícias ou memórias reais.

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