domingo, dezembro 02, 2012

"Deus não existe!.."

Gostei bastante do texto. Reflete importantes questões cosmológicas, teológicas e filósoficas sobre a existência de Deus. A tese do autor é interessante - e vale muito a pena ler. 

Se Deus existe, Ele passou muito tempo na moita até que pudesse ser percebido por alguém. O universo, como existência física, é estimado em 14,5 bilhões de anos pelo calendário terreno, quando surgiu de um ovo pré-universal, numa explosão espetacular, cujos estilhaços formam os monumentais corpos celestes. Em um desses estilhaços, dos bem pequenos, é verdade, o Homo sapiens, a nossa espécie primordial, surgiu há cerca de  145 mil anos, ou seja: a nossa existência no universo ocupa o percentual infinitamente miúdo de 0,001% da existência do mundo. 

Astronomicamente falando é um tempo tão ínfimo quanto aquele gasto no piscar de uma lagartixa no contexto de um ano. Em algum momento de nossa curtíssima trajetória, desenvolvemos alguns atributos que nos foram diferenciando da bicharada, tais como consciência, o raciocínio lógico, o desenvolvimento de ferramentas, a interferência conduzida no meio ambiente, a cultura e a intuição da existência do sobrenatural.  Só então Deus começou a dar as caras. Ou seja, a existência de Deus como ideia e conceito começa de fato com a evolução racional do ser humano, dentro de um processo da evolução natural das espécies. Daí não ser um disparate afirmar que a natureza criou o homem e o homem criou Deus. A existência de Deus, se fosse pão, ainda estava quentinho de derreter a manteiga. Nenhuma das linhagens que nos antecederam, como as bactérias, as formigas, as baratas, os crocodilos, os dinossauros, supõe-se, não chegaram a aventar, ou mesmo intuir a existência de Deus. Pela simples razão de que eram ou são seres irracionais. A existência der Deus teve início com a nossa espécie.

A existência de Deus, a rigor, é um efeito colateral da racionalidade. Ela acontece onde o nosso limitado raciocínio esgota suas forças e não consegue romper. Aí entra a ordem sobrenatural, tendo como centro o Deus absoluto, princípio, meio e fim, aquele que é ubíquo e tudo sabe, que tem visão de raio X para saber o que existe por trás das pedras, por trás de nosso discurso falho e não raro dissimulado.

Costumamos afirmar que fomos feitos à imagem e semelhança de Deus, o que nos parece não só uma forma arrogante de nos colocar em posição superior diante das demais criaturas e assim subjugá-las, mas também um evidente equívoco, prontamente observável.

Depois que fez o mundo, com sua alquimia explosiva, Deus esperou com paciência por mais de 14 bilhões de anos para inserir o homem em sua arena. Se fôssemos tão importantes como supomos ser, talvez Deus tivesse nos preparado mesmo antes da construção do cenário e nos conservado no formol divino e nos inserido em cena desde o primeiro ato. Já o Homo sapiens, ao contrário de Deus, é um bicho extremamente ansioso. Queremos alcançar resultados, atingir objetivos desde as primeiras ações.

Diante desta situação, de duas uma: ou Deus é semelhante a nós, mas não somos importantes para Ele, apesar da semelhança. (A semelhança, no caso, ao invés de produzir simpatia, pode ter produzido rejeição, pois, pelo dom da ubiquidade, Deus sabia desde sempre quem seríamos nós e do que seríamos capazes.) Ou então Deus não é semelhante a nós e, como espécie, somos apenas mais uma no desenrolar do longo novelo evolutivo, e que irá desaparecer até mais rapidamente do que as outras, como as baratas, as formigas e as bactérias, em razão de nossa racionalidade convertida em estupidez.

É uma noção quase unânime, independente da seita que se filie, ou da versão de Deus que se adote, que Ele é um ser permeável e receptivo aos nossos rapapés, que costumamos chamar de orações. E isso talvez nos fizesse especiais diante de Deus, pois somos a única espécie capaz de desenvolver rituais bajulatórios. Ora, há evidências de que Deus não se impressiona com nossos comovidos petitórios. Ou pelo menos a comoção de Deus não se manifesta de forma semelhante à comoção humana. Vez que somos tendentes a poupar de nossa ira as pessoas que nos beijam as mãos.

Ao longo da história, não foi uma nem duas vezes que templos abarrotados desabaram sobre os fiéis em oração. Exemplo típico foi o Dia de Todos os Santos de 1755, em Lisboa. Estando as igrejas da Capital repletas de fiéis, veio um terremoto. Quem sobreviveu ao terremoto foi engolido pelas chamas provocadas pelos escombros sobre as velas acesas. Quem ainda conseguiu sobreviver, em seguida foi engolido por um tsunami. Milhares e milhares de pessoas morreram rezando. A família real sobreviveu porque estava praticando um ato que contrariava a suposta vontade de Deus. Naquele domingo santo, dia de fervorosas adorações, estava fazendo churrasco e descansando na casa de verão, em Queluz.

Outro exemplo bem recente foi o tremor de terras do Haiti. Um dos países mais pobre do mundo, um povo extremamente sofrido e digno da piedade humana e divina e outras mais, se mais houver. Foi violentamente sacudido, não poupando nada nem ninguém. Levou de eito aficionados do vodu, do budismo, do islã, do cristianismo e quem mais estivesse por lá. Levou inclusive a Dra. Zilda Arns, a nossa santa viva e operante, que salvou milhões de crianças da mortalidade infantil, no Brasil e em outras partes. Inclusive estava lá em missão de salvação dos pequeninos, quando a igreja desabou sobre ela.

Em qualquer tempo e lugar, as pessoas que apostaram na hipótese de um Deus expresso e socorrista, a não ser que tenham se vendando pelas lonas do autoengano, acabaram desiludidas. O próprio Jesus Cristo, que se achava em condição mais do que especial diante das atenções de Deus, na hora em que ele mais esperava, desabafou:

− Oh, Pai, por que me abandonaste!?

Deus não é um ser de misericórdia e amor. Pelo menos seu amor e sua misericórdia não têm as feições que gostaríamos que tivessem. Nem tem o apego por nós que gostaríamos que tivesse. Talvez do que Deus goste mesmo sejam suas esferas rodopiantes, suas galáxias em espirais, suas estrelas incendiadas, seus buracos negros que povoam o universo numa profusão quase infinita. Enquanto nós, bicho da terra tão pequeno, como já sentenciou Camões, continuamos circunscritos a este estilhaço minúsculo, neste recanto de universo, que Terra tem por nome, com nosso destino atrelado ao destino das baratas e das moscas varejeiras. Ainda assim cheios de poesia em nosso triunfalismo enganoso.

Quanto ao título deste texto “Deus não existe!...” é no sentido brasileiro popular. Quando alguém nos surpreende de forma cabal, ou tem qualidades que superam quaisquer expectativas ou prescrições, nós dizemos simplesmente: “Fulano não existe!...” Assim me parece que seja Deus, uma entidade surpreendente, sobejante, incapaz de se ajustar ao entendimento humano, aos dogmas religiosos, à ciência ou à vã filosofia.

Definitivamente, Deus não existe!...
Extraído Daqui

7 comentários:

Brunno César disse...

Engraçado, eu escrevi um texto com título "deus existe". E a contradição entre título e corpo também se fez presente no meu texto.

Carlinus disse...

Bruno, passe-me o endereço do texto. Desejo lê-lo.

Obrigado pelo comentário!

Brunno César disse...

Aqui está: http://moedasdedezmilreais.blogspot.com.br/2012/11/deus-existe.html Aproveitando, parabéns pelo blog! Muito bom mesmo!

Brunno César disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Brunno César disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Brunno César disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Carlinus disse...

Obrigado pela visita e pelo elogio.

Li o texto. Esse tema muito me interessa. Nos últimos anos essa tem sido uma preocupação constante para mim. Tenho lido alguns textos a respeito do tema e mais solidifico as minhas convicções acerca da não existência objetiva de um ser supremo.

Abraços!